Insurgentes se financiam com ‘tráfico de cocaína do Brasil’

Chefe da junta militar apoia intervenção francesa, e são soldados malinenses que fazem combate por terra, garante porta-voz do Exército, em entrevista ao ‘Estado’

BAMAKO – O capitão Amadou Sanogo liderou um golpe militar em março do ano passado, alegando que o então presidente Amadou Touré não estava sendo capaz de defender o Mali do avanço dos separatistas tuaregues e dos radicais islâmicos. Entretanto, depois do golpe, os insurgentes continuaram avançando. Sanogo resistia, porém, à ideia de uma intervenção estrangeira, exigindo em seu lugar que a comunidade internacional enviasse armas ao Exército maliense, que deveria encarregar-se de enfrentar a rebelião (e garantir o seu papel de homem forte do país).

Sanogo destituiu e colocou sob prisão domiciliar em dezembro o primeiro-ministro que ele havia nomeado, Cheick Diarra, por causa de seus contatos com países vizinhos para organizar uma intervenção regional. O capitão parecia prestes a fazer o mesmo com o presidente interino Dioncoundas Traoré, quando, no dia 10, os radicais islâmicos cruzaram a linha de demarcação do conflito, avançando em direção à capital, Bamako. Provavelmente sem consultar o capitão, Traoré teve a iniciativa de telefonar para o presidente francês, François Hollande, e pedir ajuda.

A intervenção francesa, iniciada um dia depois, deslocou Sanogo do centro do poder e desde então, de seu quartel-general em Kati, 15 km ao sul de Bamako, ele tem tentado adaptar-se à nova realidade. Em entrevista ao Estado, na base de Kati, seu porta-voz, o tenente Mohamed Coulibaly, garantiu que o chefe da junta militar apoia a intervenção francesa. E sublinhou que são os soldados malienses, não os franceses, que estão reocupando o norte. Seguem trechos da entrevista, feita na manhã de sexta-feira.

Qual a posição do capitão Sanogo em relação à intervenção francesa?

O capitão é favorável à intervenção. Aqueles que dizem o contrário estão mentindo. São os soldados malienses que fazem o combate por terra. Nenhum soldado da França ou dos outros países africanos disparou um só tiro. Os soldados africanos estão estacionados em Markala (254 km ao norte de Bamako), onde não há nada. Os franceses ficam na retaguarda. Eles bombardeiam e nós avançamos e ocupamos. O capitão quer a ação dos militares. Eles são dessas cidades, e têm pressa de recuperá-las, para voltar para suas casas e seus quartéis.

Mas depois do golpe, os insurgentes continuaram avançando.

Precisávamos de equipamento para enfrentá-los, porque eles estão bem armados. O Mali já havia comprado esse equipamento, e o capitão estava pedindo aos países fornecedores que o entregassem. Agora esse equipamento (retido pelos países vizinhos por causa do golpe) finalmente está chegando.

Há uma corrida contra o tempo para desocupar o norte antes de março, quando começa o verão, as temperaturas chegam a 50 graus e as tempestades de areia dificultam a ação?

Isso não é problema. Nossos soldados estão habituados a essas condições e conhecem bem o terreno.

De onde os insurgentes recebem dinheiro?

Do tráfico de cocaína. A droga sai do Brasil e de outros países da América do Sul, passa por aqui e vai para a Europa. E também de sequestros de pessoas como você, cujos países pagam centenas de milhares de euros em resgate. Cada combatente deles recebe 500 mil francos (R$ 2.143) por mês.

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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