‘Wall Street está contra a América’

Candidato Ralph Nader acusa dos bancos de tomar riqueza do povo

NOVA YORK  – Lá dentro, a Bolsa de Valores de Nova York prosseguia no seu dramático movimento de gangorra. Do lado de fora, Ralph Nader, candidato independente a presidente dos Estados Unidos, reunia cerca de 200 pessoas na hora do almoço, para protestar contra os bancos e as grandes corporações americanas em geral. E, em particular, contra o pacote de US$ 700 bilhões de resgate das instituições financeiras.

“É Wall Street que impede o acesso do povo americano ao seu governo e à riqueza que lhe pertence, mas que ele não controla”, gritou Nader ao microfone, numa tribuna montada na frente da escadaria do Federal Hall National Memorial, erguido no local onde George Washington, o primeiro presidente americano, tomou posse diante do Congresso Constituinte, em 1789. “Wall Street se colocou contra a América”, continuou Nader, que aparece com cerca de 5% nas pesquisas de opinião – o equivalente à diferença entre o democrata Barack Obama (49%) e o republicano John McCain (45%), na média das sondagens. “É o muro (wall) que concentrou toda a riqueza e o poder.”

Uma das faixas amarradas nas colunas em estilo clássico do prédio, típico das construções destinadas a reativar a economia americana depois da Grande Depressão dos anos 30, dizia: “Caros McCain, Obama, Bush, um trilhão de agradecimentos.” Assinado: Wall Street. Outra acusava: “O Congresso e Wall Street apertaram os parafusos nos contribuintes de Main Street (‘Rua Principal’, apelido para a economia real).”

Um homem com uma cabeleira loira e paletó branco sobre uma túnica preta de pastor assumiu a tribuna depois que Nader entrou no prédio para conceder uma entrevista coletiva: “Prisão, sim, resgate, não”, gritou ele várias vezes, acompanhado pelos manifestantes. “Amém, aleluia.” Um homem passava recolhendo doações para a campanha de Nader com um balde com os dizeres: “Pegue seu país de volta. Eles roubaram sua democracia.”

Pesquisa realizada pelo Instituto Rasmussen no dia 2, um dia depois de o Senado aprovar o pacote de resgate aos bancos, indicou que 45% dos eleitores se opunham ao plano, enquanto 30% o apoiavam e 25% estavam indecisos. Além disso, 63% disseram que Wall Street se beneficiaria mais, enquanto apenas 22% consideravam que o mais favorecido pelo pacote seria o contribuinte médio.

Entre os transeuntes que pararam para assistir ao comício de Nader, predominava a resignação. “O governo não tem mais nada a fazer”, disse Robert Kavaliauskas, de 51 anos, formado em administração de empresas e funcionário do Estado de Nova York. “O colapso do capitalismo pode ser lento ou rápido. O governo está tentando fazer com que seja lento.”

“Acho que estamos numa situação em que esse debate sobre o que o governo deve ou não fazer já está ultrapassado”, opinou Quentin Altherley, de 53 anos, investigador de crimes financeiros. “Não concordo necessariamente com o resgate das instituições financeiras. Acho que o pacote deveria focalizar no crédito imobiliário. Mas alguma coisa tinha que ser feita.”

Com um olhar divertido, corretores da Bolsa transitavam em frente ao protesto, com coletes e crachás de instituições como Merril Lynch e Bear Stearns. “Não podemos dar entrevistas”, recusavam eles, sorrindo.

Dentro do prédio da Bolsa, um corretor que negocia papéis das principais empresas brasileiras concordou em conversar com o Estado pelo telefone, desde seu nome não fosse publicado. “Vamos continuar por muito tempo com esses tropeços”, disse ele. “Vai levar alguns anos até que o problema se resolva.” Segundo o corretor, os recursos destinados aos nove maiores bancos, nos valores de US$ 25 bilhões a US$ 3 bilhões para cada um, anunciados no início da semana, ainda não chegaram ao mercado e demorarão algumas semanas para causar efeito no mercado.

“O Brasil também é afetado, por causa da redução da demanda por commodities no mercado mundial e porque alguns investidores vendem suas ações lá para cobrir posições aqui”, disse ele. “Mas a economia brasileira é considerada muito sólida, e os investidores americanos que querem diversificar suas aplicações vão continuar procurando o Brasil, assim como o México, a Colômbia e o Peru, cujas políticas geram confiança no futuro.” O corretor admitiu que perdeu dinheiro nos últimos dias. “Todos perderam”, disse ele, negando-se a dizer quanto foi o seu prejuízo.

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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