Gripe suína para economia mexicana

Desde a posse de Felipe Calderón, a economia enfrenta uma série de problemas, da guerra ao narcotráfico à crise global

CIDADE DO MÉXICO  – Desde que o presidente Felipe Calderón foi eleito, em julho de 2006, o México vem numa sucessão impressionante de infortúnios. A eleição de Calderón foi contestada pelo seu rival, Andrés Manuel López Obrador, cujos seguidores armaram um imenso acampamento no centro da Cidade do México, pondo em xeque a democracia mexicana, apenas seis anos depois de ela livrar-se da virtual ditadura do Partido Revolucionário Institucional (PRI), que governara o país por 71 anos.

O governo de Calderón decidiu fazer frente ao narcotráfico, desencadeando a fúria dos cartéis, que mergulharam o país numa onda de assassinatos e sequestros, desmoralizando as forças de segurança e prejudicando o turismo. Em janeiro, um relatório do Pentágono alertava para o risco de o México converter-se num “narco-Estado”. Então veio a crise financeira mundial, que golpeou duramente a economia mexicana, dependente das exportações para os Estados Unidos – destino, juntamente com o Canadá, de quase 90% de seus produtos.

O Índice Global de Atividade Econômica caiu 9,5% em janeiro e 10,8% em fevereiro, em relação a iguais períodos do ano passado – as maiores quedas desde que o indicador foi criado, em 1994. Isso foi antes da epidemia da gripe suína – ou de seu anúncio oficial pelo governo, no dia 23. No primeiro trimestre, o Banco do México (o banco central) estima uma queda de 7%. Rogelio Ramírez de la O, da empresa de análise macroeconômica Ecanal, acredita que, com a epidemia, a queda no segundo trimestre poderá ser de 9%.

Só o fechamento dos restaurantes e bares do Distrito Federal tem causado prejuízo de 150 milhões de pesos (mais de US$ 100 milhões) por dia, segundo o setor. A economia do DF – onde ocorreram 7 das 16 mortes por influenza confirmadas até ontem – representa 30% do PIB mexicano. Por causa da crise econômica, as vendas na maior loja de departamentos do México, a Liverpool, haviam caído 5%; com a epidemia, a queda foi de 50%, segundo Aurelio Fuentes, gerente da rede. Na elegante loja de departamentos Ciudad de Hierro, no centro da Cidade do México, as listas de presentes de casamento diminuíram 50% com a crise; com a epidemia, outros 30%, disse Perla Torres, da seção de noivos.

O ministro do Turismo, Rodolfo Elizondo, prevê que, a partir desta semana, a ocupação nos hotéis de Cancún ficará em torno de 10% a 15%, quando o normal para esta época do ano seria entre 60% e 80%. Os aviões para o México estão com ocupação média de 50%. O avião em que o repórter do Estado veio de São Paulo tinha 284 lugares, dos quais 100 (35%) ocupados. A China, o Canadá, a Argentina, o Peru e Cuba suspenderam os voos para o país.

A receita anual do turismo estrangeiro, de US$ 13 bilhões, representa cerca de 1,5% do PIB, diz Raúl Feliz, do Centro de Investigação e Docência Econômicas (Cide). Somando-se ao turismo nacional, são 3% do PIB. O economista observa que o impacto sobre o turismo só não será maior porque a epidemia coincide com o período de baixa temporada nas cobiçadas praias caribenhas: os turistas americanos vêm em massa entre outubro e março, fugindo do frio. Ele pondera, no entanto, que a epidemia se alia à violência do narcotráfico para criar uma imagem negativa do México, que deverá prejudicar a alta temporada. O turismo gera 2,2 milhões de empregos diretos.

Feliz calcula que a epidemia causará uma queda de 0,5% a 1% do PIB este ano, dependendo da sua extensão. Esse impacto se soma a uma recessão de 5,3% prevista pelo economista para 2009, por causa da crise financeira. O Banco do México estima que a queda da atividade econômica será de 3,8% a 4,8%. Já Mauro Leos, vice-presidente para o México da agência de classificação de risco Moody”s, prevê que a recessão no país se estenderá por 2010.

Além do turismo, Rogelio Ramírez aponta outra fonte de receitas que pode ser prejudicada, se for mantido o aperto no controle de imigrantes mexicanos nos EUA: as remessas desses trabalhadores para o México, que somam US$ 25 bilhões líquidos ao ano. Segundo o economista, para gerar essa receita líquida em salários na indústria automobilística, por exemplo, o México teria de aumentar em US$ 100 bilhões seu volume de exportações. Ele alerta para a provável diminuição na exportação de alimentos, viagens de negócios, intercâmbio de estudantes, congressos e turnês de artistas. “Se essa psicose durar o ano inteiro, a epidemia causará queda de 1,5% do PIB.” Ele prevê uma recessão de 6% a 8% este ano – a maior desde a Grande Depressão.

Talvez a maior medida da gravidade da situação esteja no silêncio de López Obrador. O Estado telefonou para ele na sexta-feira, para saber o que pensava da condução da epidemia pelo governo de Calderón. “Vou esperar o desenrolar da situação para me pronunciar”, respondeu o líder oposicionista, com inusitada cautela.

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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