A explosão do turismo é fictícia

A idéia surgiu há coisa de três anos, numa reunião da extinta Câmara Setorial de Turismo, em Brasília.


A imprensa importunava o governo com comparações entre o número de turistas estrangeiros recebidos pelo Brasil e por outros países, a começar pela Argentina. Em 1997, os pampas argentinos haviam recebido mais de 2,7 milhões de estrangeiros, praticamente empatando com o seu vasto vizinho, que teve apenas 86 mil visitantes a mais.

Foi aí que um dos 52 membros da câmara levantou a seguinte lebre: a Argentina estava contabilizando todo mundo que passava pela fronteira, inclusive quem ia abastecer ou fazer supermercado do outro lado, enquanto o Brasil seguia pudicamente contando um a um os formulários de imigração da Polícia Federal.

Mais: o método argentino, por amostragem nas fronteiras, era empregado no mundo todo e aceito pela Organização Mundial de Turismo. Ora, disseram-se os membros da câmara, se os números eram importantes para efeitos de imagem, a solução era fazer uma contagem mais camarada.

O resultado não tardou. No ano de 1998, o Brasil ostentou a marca dos 4,8 milhões de turistas estrangeiros, um salto de quase 70%. Desde então, o incremento voltou a níveis razoáveis. Em 1999, foi de 6%. A Embratur (sigla de Instituto Brasileiro de Turismo, entidade que representa o setor) termina nesta semana de tabular os números de 2000. Segundo o presidente do instituto, Caio Luiz de Carvalho, o crescimento deve manter-se na faixa dos 6% a 7%.

O mercado sabe que a explosão do turismo brasileiro foi deflagrada pela mudança do método de contagem. Ou seja, ela não ocorreu, a não ser nos números oficiais. Mas os especialistas nunca levaram a sério esses números – nem os rankings que eles originam. “Essa discussão de ranking é de dez anos atrás”, rechaça o presidente da Embratur, à pergunta sobre por que o Brasil segue atrás de países como Cingapura e Tailândia, menores e mais distantes da Europa e dos EUA – os grandes emissores de turistas. “O importante é que o Brasil está no caminho certo.”

O novo presidente da Anhembi Turismo e Eventos da Cidade de São Paulo, Eduardo Sanovicz, explica que o turismo se abastece de números um tanto fantasiosos. Assim como no Mercosul, na União Européia o morador da fronteira que atravessa a avenida para ir à padaria no país vizinho passa para as estatísticas como turista estrangeiro.

Sanovicz acha que as viagens dentro da UE deveriam ser consideradas turismo interno, não internacional. O fato é que, nesse caso, foram os brasileiros que aprenderam um jeitinho com os outros.

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