Capital externo trouxe instabilidade, mostra estudo

Bresser e Nakano criticam modelo de desenvolvimento adotado pelo País

 

O modelo de desenvolvimento econômico baseado no capital externo, adotado na última década no Brasil, é veementemente criticado num estudo apresentado ontem pelo ex-secretário de Finanças do Estado de São Paulo Yoshiaki Nakano e pelo ex-ministro da Fazenda e da Administração Luiz Carlos Bresser Pereira, no seminário “Brasil: Como Crescer? Para onde Crescer?”, promovido pelo Departamento de Sociologia, pela Faculdade de Economia e Administração e pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.

De acordo com o estudo de Bresser e Nakano, ambos professores da Fundação Getúlio Vargas, o fluxo líquido de capital externo para o Brasil cresceu de perto de zero, em 1991, para quase 15% do Produto Interno Bruto (PIB), em 2001. No mesmo período, os investimentos externos diretos no País caíram de 25% para 16% do PIB. Isso porque o capital foi atraído pelos juros altos e maciçamente destinado à especulação, não à produção.

Nakano e Bresser citam levantamento empírico feito por dois economistas do Fundo Monetário Internacional, Martin Feldstein e Charles Horioka, que mostra uma “forte relação entre poupança doméstica e investimento”, enquanto “o mercado global de capitais tem pouco papel no crescimento econômico”. A não ser em países com endividamento pequeno e “políticas adequadas de desenvolvimento”, incluindo a promoção de exportações.

Segundo Nakano, esse levantamento revela que o endividamento pode contribuir com o crescimento econômico quando atinge até 70% das exportações, tendo um efeito positivo, nesse caso, de menos de 1% sobre o PIB. Quando a relação entre dívida e exportações chega a 160%, o efeito sobre o crescimento do PIB passa a ser nulo. A partir daí, é negativo. Numa relação de 300%, sua

pressão negativa sobre o PIB é de 1,5%. A dívida externa dos setores público e privado no Brasil, de US$ 208 bilhões, representa 362% do valor das exportações, que nos últimos 12 meses foi de US$ 57,4 bilhões.

Sem as condições adequadas, a política desenhada para a atração da chamada poupança externa não só não é destinada ao investimento como drena a poupança interna. Foi o que ocorreu, lembra Bresser, nos primeiros anos de real sobrevalorizado, entre 1994 e 1999, período de “populismo econômico”, no qual a renda dos trabalhadores esteve “artificialmente” alta em função do componente cambial nos preços dos produtos.

Essa renda esteve então canalizada para o consumo, que cresceu no período 4% do PIB, e não para a poupança. A transferência também se deu do setor privado para o público – na forma de impostos – e do País para o Exterior, no pagamento da dívida.

Entre 1971 e 1980, o PIB mundial cresceu 3,8%, o da América Latina 6% e o do Brasil 8,7%. Na década seguinte, a economia mundial cresceu 3,4% e a do subcontinente e a do Brasil 1,6%. O período foi marcado na América Latina pela superinflação – que também desestimula os investimentos e retarda o crescimento, observa Bresser. Entre 1991 e 2000, o PIB mundial cresceu 3,8%, o da América Latina 3% e o do Brasil 2,7%.

Além disso, o endividamento aprofundou a instabilidade. “É irônico, porque tudo o que o mercado esperava dessa política era a estabilidade”, observa Nakano.

O raciocínio coincide com dados sobre os fluxos globais de capital apresentados pela professora Saskia Sassen, da Universidade de Chicago: apenas 30% do dinheiro que passou pela Bolsa de Valores de Nova York nos últimos anos esteve relacionado com investimentos na produção. O restante foi destinado à especulação financeira.

Segundo dados do Bank for International Settlements (BIS, que reúne os bancos centrais), em 2001, o volume de transações internacionais com derivativos (papéis lastreados noutros papéis) alcançou US$ 168 trilhões, enquanto o comércio global foi de US$ 9 trilhões e os investimentos diretos US$ 6 trilhões.


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