Decisões políticas levaram o regime à falência de hoje

Generosidades intensificaram-se a partir dos anos 60 e consolidaram-se em 88

O primeiro sistema previdenciário do País, criado em 1923, na forma de caixa para os ferroviários, estipulava a draconiana idade mínima de 50 anos. Só na segunda metade da década de 50 o homem brasileiro atingiria essa expectativa de vida. Ao reordenar o sistema em institutos nacionais, nos anos 30, o presidente Getúlio Vargas manteve a idade mínima. Em 1960, ela foi elevada para 55 anos.

Os funcionários públicos, porém, não estavam sujeitos a essa regra. Alegando que a situação era injusta, o Congresso aboliu a idade mínima, em 1962, sem realizar estudo algum sobre o impacto que essa decisão teria nem criar provisões. Desde então, não houve mais idade mínima, até dezembro do ano passado.

A mesma lei de 1923 também estipulava que, para receber os benefícios, era necessário pagar contribuições ao longo da vida. O sistema apresentava falhas de cálculo atuarial, mas, pelo menos, estava calcado no chamado caráter contributivo. Segundo o Livro Branco da Reforma da Previdência, editado pelo ministério, foi a partir dos anos 60 que mudanças na legislação intensificaram a ruptura na relação entre contribuições e benefícios.

Várias categorias passaram a ser incorporadas no sistema, sem contrapartida de contribuições. A aposentadoria por velhice, concedida aos homens aos 65 anos e às mulheres aos 60, exigia apenas cinco anos de contribuição. Segundo levantamento do ministério, do total de aposentadorias por velhice até 1983, 71% foi concedido a mulheres inscritas como “domésticas” ou vinculadas a empresas de parentes só para usufruir do benefício.

O regime dos autônomos e as aposentadorias especiais foram outras formas de drenar a receita. Por terem participado de suposto “esforço de guerra” durante a 2ª Guerra Mundial, marítimos, portuários, aeronautas civis, alfaiates e outros que nunca estiveram na Itália foram contemplados com benefícios que chegam a dezenas de milhares de reais ao mês, enquanto dependentes de pracinhas que morreram em combate recebem alguns salários mínimos de pensão.

Em 1963, os trabalhadores rurais foram incorporados ao sistema. A contribuição era de 1% sobre o valor de produtos agropecuários, recolhida pelo produtor quando da primeira comercialização. O benefício era metade do salário mínimo vigente e a aposentadoria era por idade, a partir dos 65 anos. A receita era insuficiente e os benefícios rurais foram mantidos com as contribuições dos trabalhadores urbanos.

Os trabalhadores temporários das empresas foram incorporados ao sistema em 1974. Os maiores de 70 anos e os inválidos que não tinham cobertura previdenciária passaram a ter direito a renda mensal vitalícia, independentemente de contribuição. Em vez de o Tesouro bancar a assistência, foram usados recursos das contribuições.

A Constituição de 1988 aumentou o desequilíbrio no setor rural. O salário mínimo passou a ser piso previdenciário e a idade para aposentadoria foi diminuída para 60 anos para homens e 55 para mulheres. A despesa triplicou. A alíquota do tributo sobre os produtos agropecuários passou para 2%, mas não aliviou o déficit. Em 1997, as contribuições representaram 13,9% dos benefícios rurais.

Os segurados foram temporariamente dispensados do recolhimento de contribuições e foram facilitadas as formas de comprovação de trabalho rural. Ser filho de fazendeiro passou a ser suficiente para somar tempo de trabalho rural, que depois foi computado para obter aposentadorias mais precoces por tempo de serviço no setor urbano ou nos regimes especiais do serviço público, com benefícios altos e contribuição pequena.

A extensão da aposentadoria integral ao meio milhão de celetistas que trabalhavam para o serviço público e a devolução das contribuições que eles tinham pago a fundos de pensão completam o conjunto de generosidades da nova Constituição. Seguindo a tradição brasileira, não foram feitos cálculos do impacto nem provisões de receita.

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