Falta capacitar adultos para que gerem renda

Governo promete focar políticas públicas na família ao unificar cadastros de programas

 

MARAGOGIPINHO, BAHIA SANTA RITA DE OURO PRETO, MINAS – A família deve estar no centro das políticas públicas. Com esse conceito em mente, o governo federal está integrando os cadastros e as ações do Bolsa Família e do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti). A unificação deverá eliminar superposições hoje existentes, de famílias que recebem dinheiro dos dois programas. O benefício maior será mantido.

Com a economia resultante, o governo pretende expandir o Peti, do 1 milhão de crianças e adolescentes atualmente atendido para 2,2 milhões, até o fim do ano. Como existem 2,7 milhões de menores de 16 anos trabalhando, o governo estima que restarão 500 mil fora do programa. “Esse é um núcleo duro”, define Osvaldo Russo, secretário nacional de Assistência Social do Ministério do Desenvolvimento Social e do Combate à Fome. Esse núcleo é formado predominantemente por moradores de rua.

A unificação dos dois programas de transferência de renda é vista com preocupação pelos especialistas. Eles temem que haja uma absorção do Peti pelo Bolsa Família, um programa muito maior, que no fim do ano deverá atender 11,2 milhões de famílias, com 17 milhões de crianças. E que a ênfase recaia sobre a transferência de renda, em vez dos aspectos qualitativos do programa. É exatamente o contrário do que os especialistas acham que deve ser feito.

Dar dinheiro, sem mais, perpetua a dependência dessa ajuda, transmitida de geração em geração. O mais importante é capacitar os adultos a gerar renda, de maneira a não precisar mais de ajuda, e preparar as crianças para a próxima geração dar um salto. No caso dos moradores de rua, por exemplo, uma política bem-vista, adotada na cidade de São Paulo, é organizar os catadores de lixo em cooperativas, com caminhões e usinas de reciclagem.

A necessidade de focar o trabalho na família é ilustrada pela experiência do Movimento de Organização Comunitária (MOC), que atua desde 1967 na região dos sisais em torno de Feira de Santana, na Bahia. Considerado um caso bem-sucedido de combate ao trabalho infantil, o grupo, de 70 profissionais, investiu na educação das famílias. “Hoje, as famílias entendem a importância de as crianças irem para a escola, e participam dela”, descreve Nayara Silva, da área de comunicação do MOC.

No caso específico do Peti, sustentam os especialistas, o programa deve evoluir da simples concessão da bolsa para a ênfase na jornada ampliada, na qual as crianças participem de atividades lúdicas, com valor pedagógico, para desenvolver suas habilidades cognitivas.

“Em princípio, as ações devem ser integradas, não adianta áreas como saúde, assistência social, educação, trabalho e turismo atuarem separadamente”, avalia Itamar Gonçalves, da Fundação Abrinq. “Nosso receio é que a ação se pulverize, perca-se o foco.”

O Orçamento de 2006, ainda não aprovado, destina R$ 900 milhões para as bolsas do Peti e R$ 325 milhões para ações socioeducativas para as crianças. “O que caracteriza a força e qualidade do Peti é a jornada ampliada”, reconhece Russo. “Juntando-se os cadastros, vai-se ter mais segurança na concessão dos benefícios, haverá economia com gastos operacionais, e vão-se reorientar os esforços da equipe para o conteúdo pedagógico da jornada ampliada e para o controle da condicionalidade”, diz ele, referindo-se à proibição do trabalho infantil, sob pena de se descredenciar do programa.

“Defendemos o cadastro único, mas não tenhamos ilusão: não é simplesmente transferência de renda que protege as crianças do trabalho infantil”, alerta Isa de Oliveira, do Fórum Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil. “Essa é a porta de entrada. A porta de saída é a promoção das famílias. É preciso buscar uma estratégia de sobrevivência para elas.” 


Deixe o seu comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

*