Jefferson acusa cúpula do PT e Dirceu de comandar corrupção

No Conselho de Ética, presidente do PTB confirma denúncias e defende renúncia do ministro para não arrastar Lula consigo

 

Num depoimento de seis horas e meia, contundente e rico em detalhes, mas não em provas, o presidente do PTB, Roberto Jefferson, cumpriu a ameaça de causar terremoto político, acusando a cúpula do PT e o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, de comandarem esquema de corrupção que vai do mensalão a caixa 2 para campanhas eleitorais de aliados.

Jefferson, antes na base do governo, a quem Lula conferiu “cheque em branco”, recomendou que Dirceu renuncie, sob pena de arrastar consigo o presidente. Insistiu em ter falado sobre a mesada a deputados com seis ministros, incluindo o da Fazenda, Antonio Palocci, que nega ter tido conhecimento do assunto. Só depois de Jefferson falar com Lula, no início do ano, o mensalão teria sido cortado.

O mais grave foi a denúncia de que o dinheiro para aliciar parlamentares e partidos é público e chega a destinatários por empresas e agências de publicidade que mantêm contratos com o governo. Afirmou que o dinheiro para a campanha do PTB foi trazido pelo publicitário Marcos Valério em malas com cédulas de R$ 50 e R$ 100 “etiquetadas pelo Banco Rural e Banco do Brasil”.

A negociação teria sido feita com o presidente do PT, José Genoino; o dinheiro, entregue por Delúbio Soares, tesoureiro do partido, e por Marcelo Sereno, secretário de Comunicação do PT e ex-assessor de Dirceu na Casa Civil. Genoino e Delúbio lhe teriam dito que “a menor pedida foi a do PTB”.

DIÁLOGO

De R$ 20 milhões prometidos, apenas R$ 4 milhões teriam sido repassados, em duas parcelas. Jefferson disse ter procurado Dirceu diversas vezes para cobrar o restante. O deputado contou ter dito ao ministro: “Zé, está esgarçando, estou perdendo autoridade.” Ao que Dirceu responderia: “Roberto, a Polícia Federal é meio tucana. Botou em cana 62 doleiros agora, véspera de eleição. A turma que ajuda não está podendo internar dinheiro no Brasil.”

Exibindo notável domínio de cena, Jefferson, que entre 1979 e 1985 atuou como “advogado do povo” no programa O Povo na TV, do SBT, deu um conselho ao ministro da Casa Civil, olhando fixamente para as câmeras: “Zé Dirceu, se você não sair daí rápido, você vai fazer réu um homem inocente, que é o presidente Lula. Sai daí rápido, Zé. Para você não fazer mal a um homem bom, correto, que eu tenho orgulho de ter apertado a mão.”

Invertendo os papéis de acusado para acusador, e colocando vários membros do Conselho de Ética na defensiva, Jefferson disse que a mesada do governo aos parlamentares da base aliada era recebida e distribuída pelos presidentes do PL e do PP, Valdemar Costa Neto (SP) e Pedro Corrêa (PE), respectivamente, e pelos deputados Bispo Rodrigues (PL-RJ), Sandro Mabel (PL-GO), Pedro Henry (PP-MS) e José Janene (PP-PR).

Dirigindo-se a eles, Jefferson concluiu assim a primeira parte de seu depoimento de uma hora de duração, seguido das perguntas dos deputados: “Me perdoem de coração, eu não gosto de ser cúmplice de vocês nessa história que envergonha uma grande parte da Câmara dos Deputados.”

Ressalvando que não eram todos os deputados do PL e do PP que recebiam mesada, Jefferson afirmou, no entanto, que todos os partidos têm suas campanhas financiadas por empresas com contratos com estatais. “Aqui todos sabem de onde vem o dinheiro da campanha: das empresas que na maioria das vezes mantêm relações com empresas públicas. Sempre foi assim.”

Num depoimento que, se acurado, equivale a roteiro para a CPI dos Correios – que suspendeu a escolha de seu presidente e relator para aguardar a sessão do Conselho de Ética -, Jefferson confirmou que Delúbio lhe ofereceu o mensalão como uma forma de “tirar a unha encravada” de deputados.

Vestindo camisa e gravata violetas, Jefferson, saído de confinamento de uma semana no apartamento funcional, manteve-se tranqüilo ao longo da sessão. Diante de discurso extraordinariamente inflamado de Sandro Mabel, que negou ter aliciado deputados com o chamado “mensalão”, ele advertiu: “O governador Marconi Perillo vem aí”, referindo-se à denúncia da secretária de Ciência e Tecnologia de Goiás, deputada Raquel Teixeira, de que um membro do PL,

supostamente Mabel, lhe teria oferecido R$ 1 milhão de “luvas” e R$ 30 mil por mês para trocar o PSDB pelo PL.

Jefferson também acusou a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) de ter sido usada para criar provas contra ele e seu partido, com a gravação que mostra Maurício Marinho, ex-chefe de Contratação dos Correios, aceitando R$ 3 mil de propina em nome do deputado e do PTB.

METRALHADORA

Disparando metralhadora giratória, o deputado insinuou que Polícia Federal, Ministério Público Federal e Corregedoria-Geral da União não se empenharam em investigar envolvimento da cúpula do PT no suposto esquema de corrupção dos Correios. Segundo ele, “60% das atividades bilionárias dos Correios estão na diretoria de Informática”, sob influência de Silvio Pereira,

secretário-geral do PT. “Não compreendi por que não investigaram o Correio Aéreo Noturno do seu Silvinho.”

Lembrando o papel do motorista Eriberto no caso Fernando Collor, do qual aliás foi defensor até o fim, como líder da “tropa de choque”, Jefferson exortou o motorista do publicitário Marcos Valério a depor sobre as malas de dinheiro saindo da agência e suposto saque de R$ 1 milhão no Banco Rural, denunciados por sua ex-secretária Fernanda Somaggio.

Irônico, Jefferson, que completou 52 anos, agradeceu a Costa Neto o “presente” que o PL lhe deu,

abrindo a representação contra ele no Conselho de Ética. E dando-lhe a oportunidade de “falar ao povo brasileiro”.


Colaboraram: Leonencio Nossa e Luciana Nunes Leal, de Brasília


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