Para aliados, Itamar será voz da resistência

Idéia é que ex-presidente lidere façcão defensora de projeto próprio de poder, humilhada por FHC

 

BELO HORIZONTE – Para este segundo turno em Minas Gerais, as pesquisas têm mantido consistentemente o ex-presidente Itamar Franco (PMDB) com cerca de 15 pontos de vantagem sobre o governador Eduardo Azeredo (PSDB). Já bem menos consistente é a resposta à pergunta – o que representaria, no cenário nacional, a vitória de Itamar?

A oposição de esquerda que o apóia procura caracterizar o eventual governo de Itamar como potencial foco de resistência a Fernando Henrique Cardoso. Em Minas, no entanto, nada é preto no branco. Em se tratando de Itamar e do PMDB, então, o cinza tende a predominar. “Daqui para a frente, Itamar vai ser o político mais importante do País”, entusiasma-se o coordenador político de sua campanha, Aloísio Vasconcelos.

“A grande força de centro-esquerda deixa de ser Lula e passa a ser Itamar.” Isso, porém, não quer dizer, necessariamente, que ele assumirá a oposição. “Itamar vai ficar do lado do interesse do Brasil e de Minas”, assegura Vasconcelos. “Não dirá amém nem sim, senhor”, avisa. “O ex-presidente não assumirá papel automático, nem de oposicionista, nem de governista”, completa. “Se vai negociar? Ele prefere a palavra ‘entendimento'”, corrige o coordenador político.

Não é essa a expectativa do prefeito de Belo Horizonte, Célio de Castro (PSB). Eleito com 81% dos votos em 1996, ele empenhou sua popularidade à faceta de oposicionista de centro-esquerda de Itamar, neste segundo turno. “A vitória de Itamar, se confirmada, insere-se no contexto nacional”, disse o prefeito, referindo-se às possibilidades de derrota do PFL no Rio e do PSDB em São Paulo e de vitória do PT no Rio Grande do Sul e no Distrito Federal.

Derrotas dos candidatos do presidente no eixo Minas-São Paulo-Rio, se confirmadas, “acabarão com a ilusão de que o eleitorado brasileiro consagraria a hegemonia quase imperial de Fernando Henrique”, analisa Castro. Mais que isso. Itamar passaria a liderar a facção do PMDB defensora do projeto de poder próprio, “humilhada” por Fernando Henrique em Minas e em outras partes, segundo o prefeito.

Antes do primeiro turno, Castro tentou fechar coligação de Itamar para governador e do ex-prefeito de Belo Horizonte Patrus Ananias (PT) para vice.

Teriam vencido no primeiro turno, quando Itamar teve 44%, Azeredo, 38%, e Patrus, 16%. Mas Patrus não está tão seguro quanto seu ex-vice-prefeito de que Itamar venha a converter-se em liderança oposicionista.

“Eu gostaria muito, mas não tenho certeza de que acontecerá”, alerta o ex-prefeito que, neste segundo turno, seguiu à risca a orientação do partido pela neutralidade, ao contrário de 20 dos 27 prefeitos petistas, que apóiam Azeredo, e de alguns deputados estaduais e federais, que declararam voto a Itamar.

“Talvez Itamar não seja tão subserviente quanto o atual governador”, admite Patrus. “Mas ele está assentado sobre o PMDB, partido ambíguo, e cujo líder maior, Newton Cardoso, tem relação muito próxima com o Palácio do Planalto.”

Em fevereiro, o prefeito de Contagem foi recebido no Planalto. Saiu como articulador mineiro da operação nacional que, no mês seguinte, derrotaria a tese da candidatura própria do PMDB à Presidência – em detrimento justamente do governador Azeredo, às voltas com a poderosa chapa Itamar-Newton. Itamar era um dos mais cotados para enfrentar Fernando Henrique.

Esse foi apenas um dos episódios em que o orgulho mineiro – arraigado, porém suscetível – se viu ferido pelo governo federal. “Azeredo e Itamar disputaram o apoio do presidente, submetendo Minas a uma situação humilhante, mas ele não veio durante a campanha, para não se comprometer”, observa Patrus. E mais: “Não há uma obra sequer do governo federal em Minas, quando há até no Estado de Pernambuco de Miguel Arraes.”

A oposição tem procurado atribuir os problemas de Minas à incapacidade do governador de aproveitar-se do fato de ser do partido do presidente. Isso, apesar de, aos olhos do resto do País, Minas ter renegociado com sucesso sua dívida de R$ 18 bilhões – 40% da qual, segundo Azeredo, contraída pelo ex-governador Newton Cardoso, candidato a vice de Itamar.

Ofendidos, muitos mineiros querem mais que um governador: alguém que se atreva a impor-se diante do presidente da República. Esse supergovernador seria Itamar, a quem, afinal, o atual presidente já esteve subordinado, na condição de ministro das Relações Exteriores e da Fazenda.

Quem se distraía assistindo ao programa eleitoral de Itamar, pensava que ele era candidato a presidente. “O Brasil reencontrará seu rumo em Minas”, foi uma das mensagens de sexta-feira à noite. Newton, popular no interior, chegou a declarar, em comício, que vai “operar o governo, enquanto Itamar participará das decisões em Brasília”.

“O fato de Itamar ter sido presidente é o que mais pesa”, analisa o prestigiado cientista político Fábio Wanderley Reis, professor-emérito da Universidade Federal de Minas Gerais. “Sua campanha baseia-se na noção de que ele está no mesmo nível do presidente.” Itamar martelou essa idéia incansavelmente. Sua coligação chama-se Minas Levanta a Sua Voz e sua música de campanha diz assim: Com Itamar Franco, Minas vale mais. Mas como diz o professor Reis, “a relação de Itamar com Fernando Henrique é nebulosa”.


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