Petrobrás pode cancelar outros contratos

Estatal tem razões comerciais para rever contratos de afretamento de plataformas e serviços de perfuração, por causa de atrasos e da descoberta de poços mais rentáveis

A decisão de cancelar quatro contratos de afretamento de plataformas e de serviços com as empresas Marítima e Falcon foi comunicada oficialmente às empresas na sexta-feira à tarde, ao final da reunião do Conselho Administrativo da Petrobrás. Entretanto, a decisão política já havia sido tomada antes: na quinta-feira, o ministro das Minas e Energia, Rodolpho Tourinho, já sabia da rescisão.

Esse detalhe é importante para reconstituir o processo de decisão e, com ele, os verdadeiros motivos que levaram à rescisão dos contratos. Fontes do ministério e da Petrobrás mencionaram as suspeitas que vinham sendo lançadas sobre esses contratos como um dos motivos da decisão.

O Estado tentou falar ontem com Tourinho e com o presidente da Petrobrás, Henri Phillipe Reichstul, mas as Assessorias de Imprensa informaram que ambos estavam na Bacia de Campos, visitando a plataforma P-18, da Petrobrás, recém-convertida para exploração e produção. O diretor de Exploração e Produção, José Coutinho Barbosa, disse ontem à noite a jornalistas no Rio que a decisão foi tomada pela diretoria da Petrobrás, e não pelo Conselho.

Em nota distribuída à imprensa às 19h40 de segunda-feira, a Petrobrás informou que os encerramentos foram provocados por atrasos na entrega das três plataformas, cada uma com mais de 210 dias. Acontece que não são só esses os contratos com atrasos dessa ordem. Segundo uma lista que a Petrobrás mostrou ao Estado, sem os nomes das contratadas (mas com exceção da Marítima), nos contratos de afretamento firmados entre a estatal e diversas empresas, de meados de 1996 a janeiro de 1998, os atrasos têm sido sistemáticos. Em seis contratos, eles são de 269, 200, 188, 180, 144 e 109 dias.

Ao comunicar às empresas o encerramento dos contratos, Coutinho apontou os atrasos como o motivo contratual que permitiria uma rescisão sem ônus. Mas explicou também que a decisão se devia ao enxugamento de seu orçamento, afetado pela desvalorização do real, já que mais de 70% dos contratos firmados pela estatal são orçados em dólar.

Do ponto de vista empresarial, a Petrobrás tem também outro forte motivo para cancelar não só esses, mas vários outros contratos de afretamento de plataformas e serviços de perfuração: o descobrimento de novas áreas, de poços bem mais rentáveis, porém de lâmina d’água bem mais profunda.

Os campos de Marlim e Marlim Sul, para os quais essas e outras plataformas foram contratadas, estão perdendo interesse comercial para a Petrobrás. E, com eles, as plataformas contratadas, que operam em lâmina d’água de até 1.500 metros, para produção de no máximo 10 mil barris por dia. Enquanto isso, no campo de Roncador, por exemplo, a lâmina já chegou a 1.900 metros e a produção estimada de petróleo, a 25 mil barris por dia.

Em contrapartida, os contratos da Marítima e da Falcon vinham sendo alvo de bombardeio acirrado por concorrentes, que fomentaram suspeitas de favorecimento entre essas empresas e a antiga diretoria da Petrobrás, sobretudo o presidente, Joel Mendes Rennó, e o diretor de Exploração e Produção, Antonio Carlos Agostini, que deixaram a empresa em março.

Agostini não quis falar ao Estado. Rennó disse que “tudo foi feito segundo a Lei de Licitações”.

A Marítima, mesmo depois dos cancelamentos, no valor total de US$ 383,7 milhões, continua no topo do ranking dos contratos com a Petrobrás, somando US$ 1,5 bilhão. A Falcon, depois de perder contratos no valor de US$ 135,8 milhões, está em quinto lugar, com US$ 504 milhões contratados (ver quadro).

No início do ano, ainda sob a diretoria anterior, a Petrobrás já havia feito menção de cancelar esse mesmo contrato com a Falcon, do afretamento e serviços da plataforma Falcon-100. Carta da Superintendência de Exploração e Produção comunicava à empresa que o contrato seria cancelado. A própria Petrobrás depois voltou atrás e decidiu negociar. Segundo boatos na época, Rennó teria protagonizado o recuo, por supostas relações promíscuas que mantinha com a Falcon. A Petrobrás explicou ao Estado que não cancelou na época simplesmente porque a Falcon, diante da carta, mostrou-se disposta a negociar.

A reputação criada em torno da Marítima é a de uma empresa beneficiada por mudanças nos contratos – seja no preço ou no prazo – e por negociações diretas com a Petrobrás. Seria o caso da plataforma P-36, inicialmente negociada para operar no campo de Marlim Sul e depois em Roncador. Teria sido aceito projeto inadequado e autorizado aumento do preço em US$ 20 milhões, para a correção. E ela estaria com mais de um ano de atraso.

A Petrobrás explica que mudou o local de operação em função de seus remanejamentos rotineiros, em busca de otimização do uso das 35 plataformas. Alteração no sistema de compressão foi necessária por causa da mudança do local, onde será produzido mais gás. Em conseqüência das modificações, o prazo foi dilatado para novembro de 1999. Mas a plataforma deve chegar em outubro e portanto não há atraso, segundo a Marítima.

Na visão dos denunciantes, as mudanças nos contratos em que a Marítima está envolvida a beneficiam. Já a Marítima os classifica como transtornos que é obrigada a contornar e como incidentes de percurso normais no setor.

Revisões de projetos de instalações de produção são comuns e inerentes à atividade, segundo a Petrobrás e a Marítima: se se esperasse conhecer todas as características do campo antes de encomendar a plataforma, se perderia muito – ou toda – a viabilidade econômica do projeto.

Segundo a Marítima, os atrasos de sondas de perfuração já existentes também são normais no setor. Isso porque qualquer problema técnico que paralise temporariamente os trabalhos da sonda exige que ela permaneça no local pelo período a mais que perdeu parada. Com o mercado aquecido, os atrasos são mais freqüentes. Por isso que a Petrobrás diz ter buscado, com as licitações, estimular a construção de novas sondas.

Com o mercado aquecido, os atrasos são mais freqüentes. Por isso que a Petrobrás diz ter buscado, com as licitações, estimular a construção de novas sondas. Além das duas plataformas Amethyst, cujos contratos a estatal cancelou, foram contratadas por licitação outras quatro, também da Marítima. Uma sétima plataforma foi contratada da Schahin, por carta-convite para negociação direta, da qual a Marítima foi excluída, por causa dos atrasos das sondas anteriores.

As quatro plataformas restantes contratadas da Marítima estão em construção, duas nos estaleiros da texana TDI e as outras duas na Daewoo, na Coréia do Sul. Suas datas contratuais de chegada vão de junho a dezembro deste ano. Devem iniciar os serviços também com atrasos, de alguns meses, segundo a Marítima.

É importante salientar que a Petrobrás não desembolsou nenhum dólar ainda nesses contratos. Isso porque são contratos de serviços, que só começam a ser pagos quando se iniciam. As plataformas são propriedade das empresas contratadas.

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