Simulação mostra custos reais para segurados

Para se aposentar com salário integral, seria preciso contribuir com 20% por 45 anos

Um segurado com curso superior completo – e portanto renda crescente ao longo da carreira – que começasse a contribuir para a Previdência aos 20 anos e se aposentasse aos 65 teria de recolher sobre seu salário bruto contribuição de 20%, ao longo desses 45 anos, para receber o benefício equivalente ao seu último salário. Para se aposentar com 45 anos, como fizeram muitos, teria de pagar mensalmente 88%; ou, começando a contribuir só aos 25, teria de pagar mais que o salário: 101%.

Já um trabalhador sem primeiro grau completo – e portanto com menos chance de ascensão – que começasse a contribuir aos 15 anos e se aposentasse aos 65 teria de pagar alíquota de 18% durante esses 50 anos para também receber de aposentadoria o último salário integralmente. As contribuições poderiam ser divididas entre o trabalhador – seja da iniciativa privada, seja do funcionalismo – e seu empregador.

Esses são apenas dois de muitos resultados obtidos em simulações sobre dados estatísticos da população brasileira, em estudo realizado pelos técnicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), do Ministério do Planejamento. Cruzando informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), da Pesquisa Nacional de Amostragem Domiciliar e do Dataprev, o órgão de processamento de dados da Previdência, os técnicos chegaram ao que chamam de “alíquotas equânimes”, ou seja, as contribuições suficientes para os segurados garantirem seus benefícios, sem déficit para o sistema.

Os técnicos não ignoram que o sistema brasileiro é de repartição, e não de capitalização individual. Ou seja, as contribuições dos ativos de hoje não servem para custear as respectivas aposentadorias futuras, mas as aposentadorias dos atuais inativos. Entretanto, para introduzir racionalidade no sistema e discutir sua equanimidade e sua sustentabilidade, os técnicos simulam uma situação de capitalização – como se não houvesse “estoque” de inativos.

Esse modelo, em que as contribuições e os benefícios são calibrados de maneira que o segurado pudesse sustentar a si mesmo, é chamado de “sistema de capitalização virtual”. Uma vez posto em prática, ele traria equilíbrio ao sistema, no longo prazo, com revisões periódicas de contribuições e benefícios, conforme fosse sendo testado na vida real. As simulações trazem várias combinações de idade de entrada no sistema e idade de aposentadoria, conforme escolaridade e sexo.

Obviamente, quem começa a contribuir mais tarde e quer aposentar-se mais cedo teria de contribuir mais. O critério de escolaridade, em lugar do de faixa de renda, foi escolhido pelos técnicos porque espelha melhor as alterações por que passa o segurado ao longo de sua vida. Quanto maior a escolaridade, maior o aumento entre o primeiro e o último salários, porque maiores as chances de ascensão. Logo, quanto maior a escolaridade, também maior a alíquota, já que a hipótese é a de que o benefício seja equivalente ao último salário e a contribuição começa a ser paga sobre salário bem mais baixo. Em todo caso, renda e escolaridade costumam ser concomitantemente altas ou baixas.

Mulheres vivem mais do que homens. Como recebem o benefício por mais tempo, poderiam ter de pagar alíquotas mais altas para as mesmas condições. Entretanto, no Brasil real, os salários das mulheres evoluem menos do que os dos homens. Assim, elas se aposentam com salários mais próximos daqueles com que começaram a contribuir. Por isso, em muitos casos, suas alíquotas seriam menores.

Esse sistema hipotético assume todos os benefícios abrangidos pela Seguridade Social: aposentadorias por idade avançada e tempo de serviço, invalidez temporária ou permanente, pensão por morte e por prisão do segurado. Em todos os casos, foram usados os dados reais do Brasil, em que a duração média do auxílio por doença é de três meses e do auxílio por reclusão, de dois anos. “Esses custos, na verdade, são pequenos”, constatam os autores.

As simulações trabalham com três índices diferentes de rendimento para o capital formado pelas contribuições: 2%, 3% (o escolhido para os resultados mostrados nesta reportagem) e 4% ao ano. É comum, no Brasil, imaginar que o rendimento mínimo seria de 6% ao ano, supostamente pago pela poupança. Entretanto, segundo especialistas, em períodos longos como os que servem de referência para sistemas de previdência, esse índice é inalcançável.

Muitas vezes, a poupança esteve muito aquém da correção monetária. “Dependendo do período considerado, a perda foi de até 50% do capital investido”, dizem os autores. Os fundos de pensão americanos trabalham com índices de 2% a 4% ao ano, compatíveis, por sua vez, com as taxas de remuneração dos títulos de 30 anos do Tesouro dos Estados Unidos, que pagam de 2% a 3% acima da inflação. Há, ainda, taxa de administração de 10%, equivalente aos custos reais do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS).

“As simulações realizadas demonstram claramente que os custos das aposentadorias precoces, expressos em termos de alíquotas de contribuição sobre salários, são extremamente elevados e em alguns casos as contribuições necessárias para cobrir os custos dos benefícios superariam o valor dos salários”, concluem os autores. “Em termos práticos, isso significa que algumas categorias da sociedade brasileira, que usufruem dessas aposentadorias precoces (por tempo de serviço e especiais), estão recebendo brutais subsídios do restante da população.”

Outras simulações podem ser feitas sobre salários líquidos ou considerando não toda a população, mas apenas a que contribui efetivamente. Esse é apenas um primeiro ensaio para ver o que seria equânime e sustentável.

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