‘Teremos o maior orçamento da história para a reforma agrária’, afirma ministro – 18/8/2003

Rossetto diz que meta é buscar terras melhores, com acesso a mercados e com infra-estrutura

No ano que vem, o governo federal destinará o maior volume de recursos da história do Brasil para a aquisição de terras para a reforma agrária. A desapropriação de áreas consideradas grandes e improdutivas continuará norteando o programa. Mas serão buscadas terras melhores, com acesso a mercados e com infra-estrutura. Serão mais caras, porém mais produtivas, divididas em lotes menores. Com isso, o governo pretende melhorar a relação custo-benefício da reforma agrária. Os novos rumos do programa foram delineados na sexta-feira pelo ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, em entrevista ao Estado.

Estado – Vai haver mudanças substanciais em relação ao programa de reforma agrária que vinha sendo executado pelo governo anterior?

Miguel Rossetto – Sim. Nós concluímos no primeiro semestre um processo de avaliação importante sobre a situação dos assentamentos, a capacidade operacional do Incra e de aquisição de terras públicas e o marco legal. E estamos num processo de síntese de toda esta avaliação e daquilo que já compõe as diretrizes básicas de um novo modelo de reforma agrária. Basicamente, será a superação de uma política de assentamentos tão-somente, em áreas de baixíssima capacidade produtiva, para um modelo que tenha como centro a produção, geração de renda, qualidade social e integração econômica regional.

Estado – Vai-se continuar utilizando o recurso das desapropriações?

Rossetto – Sim, isso é importante. De acordo com a Constituição e a legislação, são passíveis de desapropriação propriedades grandes – acima de 15 módulos rurais (um módulo pode ter de 8 a 100 hectares, dependendo da região) – que sejam improdutivas e portanto não cumpram sua função social, determinada pelo grau de utilização da terra. O segundo passo é a verificação do valor da terra e das benfeitorias e o pagamento para o proprietário. A terra continuará sendo paga em Títulos da Dívida Agrária e as benfeitorias em dinheiro à vista. Há outro espaço importante, que são as propriedades com menos de 15 módulos – estimadas em 40 milhões de hectares -, e aí trabalhamos com o instrumento complementar de reforma que é o crédito fundiário.

Estado – O sr. se queixou recentemente de que com R$ 180 milhões não dava para fazer reforma agrária nem no Rio Grande do Sul, seu Estado. Já existe uma luz no fim do túnel quanto aos recursos?

Rossetto – Nós herdamos um Orçamento extremamente apertado para o conjunto do governo e isso obviamente reduz muito a capacidade operacional. Já temos sinalizações positivas de expansão de recursos no segundo semestre. Em 2004 teremos o maior orçamento da história do Brasil para aquisição de terras para a reforma agrária.

Estado – Nos oito anos do governo Fernando Henrique foram investidos R$ 20 bilhões e assentadas 500 mil famílias, ao custo médio de R$ 40 mil. O sr. acha que isso é razoável, do ponto de vista da relação custo-benefício?

Rossetto – Estamos trabalhando com duas referências novas que podem ampliar o valor médio da terra e, ao mesmo tempo, diminuir o custo da reforma agrária. Eu explico: por um lado, estamos direcionando uma política de aquisição de terras levando em consideração a sua qualidade produtiva, proximidade com mercados e disponibilidade de serviços públicos e infra-estrutura. A experiência nos mostrou verdadeiros fracassos na medida que se constituíam tão-somente assentamentos, em áreas desprovidas de condições básicas para os assentados e para a produção.

Estado – Existem ainda terras grandes e improdutivas em áreas com essas características?

Rossetto – Sim. Evidentemente, não estamos falando de áreas próximas a grandes metrópoles. Isso é uma diretriz, que obviamente pode aumentar o custo médio de aquisição, na medida em que basicamente o governo Fernando Henrique concentrou a aquisição de áreas nas regiões Norte e Nordeste, em Mato Grosso, no Maranhão e no sul do Pará. Ao mesmo tempo – e esse é o dado novo -, por conta dessas condições, e da disponibilidade de tecnologia e assistência técnica, o que é uma mudança forte, temos condições de reduzir a área média por família nos nossos assentamentos, de 25 para 10 a 15 hectares. Vamos garantir um padrão de utilização dessa terra, através de cooperativas e associações e, com tecnologia agregada, permitir o maior número de famílias por hectare. É uma estratégia nova, que otimiza recursos, buscando um padrão de eficiência. O caro é o ineficiente. Torna-se caro quando tem um padrão de investimentos públicos com baixíssimo retorno. Isso amplia o custo financeiro e social. Não faremos tudo. Mas tudo o que fizermos será bem feito.

Estado – O projeto de lei que reconhece os títulos de terras devolutas de até 500 hectares no Estado de São Paulo pode atrapalhar?

Rossetto – Não conheço e não gostaria de me manifestar especificamente sobre o mérito. O Estado de São Paulo tem uma legislação de vanguarda, que assegura todas as áreas devolutas e públicas para programas de reforma agrária. Estamos trabalhando fortemente em convênio com o governo do Estado. Já asseguramos o repasse de R$ 29 milhões para acelerar a oferta de terras públicas para a reforma agrária, especialmente no Pontal do Paranapanema.

Estado – Esse público de candidatos a assentamento é de quantas famílias?

Rossetto – Temos algo em torno de 130 mil famílias acampadas. O número de não-acampados potencialmente beneficiários do programa vai de 2 milhões a 4,5 milhões. Se considerarmos arrendatários, meeiros, bóias-frias, trabalhadores sazonais, chegaremos a números próximos a esses. Ainda estamos debatendo o planejamento para os próximos três anos e meio. Mas é determinação do presidente Lula uma reforma agrária ampla, maciça e com qualidade.

Estado – O sr. precisará investir na qualidade dos que já estão assentados?

Rossetto – Sim. Estamos priorizando a oferta de assistência técnica, crédito, compra direta através da Conab, para gerar renda para esses assentamentos.

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