Ex-ditador pode estar em casa em uma semana

Pedido de extradição só chegaria depois de a Câmara dos Lordes libertá-lo

 

O senador vitalício Augusto Pinochet deve voltar para casa na próxima semana, por uma feliz – para ele – combinação de fatores políticos, jurídicos e até de calendário. A Câmara dos Lordes reúne-se na quarta-feira para analisar a apelação da decisão da Alta Corte em favor de sua imunidade diplomática. A Câmara dos Lordes nunca contrariou decisão da Alta Corte.

Restaria a possibilidade de uma decisão política do governo britânico de acatar pedido de extradição encaminhado pelo governo espanhol. Acontece que o Conselho de Ministros da Espanha só se reúne às sextas-feiras. Bingo!

Quando o gabinete espanhol estiver discutindo se pede ou não a extradição do ex-ditador, na sexta, Pinochet já poderá estar no aconchego do Chile, uma vez liberado, dois dias antes, pela instância máxima da Justiça britânica.

Ironicamente, num caso em que predominou a discussão acerca da autonomia da Justiça, a última palavra – ou o último silêncio – acabará recaindo sobre o Executivo. Para evitar o retorno de Pinochet ao Chile, que tornará inócuo qualquer pedido de extradição, o governo espanhol teria de tomar a decisão política de realizar reunião extraordinária antes da quarta-feira e de encaminhar o pedido.

Nesse campo puramente político, analistas em Londres e Madri ouvidos pelo Estado têm tentado perscrutar os sentimentos dos respectivos chefes de governo. E aqui, o caso se torna verdadeiramente fascinante.

O primeiro-ministro espanhol, o centro-direitista José María Aznar, de quem, no final, partiria a decisão de pedir a extradição de Pinochet, não estaria pessoalmente motivado a fazê-lo – não por apoiar ditaduras, mas por estar desvinculado dos movimentos de esquerda que aspiram mais fervorosamente a um acerto de contas com o senador vitalício.

Já o primeiro-ministro britânico, o centro-esquerdista Tony Blair, poderia acolher com satisfação um pedido de extradição de Pinochet, para vê-lo julgado na Espanha ou em outros países de onde pode proceder o pedido, como França e Suíça.

Entretanto, na situação interna de cada país, não parece tão simples. As pesquisas têm indicado que entre 70% e 80% dos espanhóis querem que Pinochet seja julgado na Espanha. “Inicialmente, Aznar criticou o processo movido contra Pinochet na Espanha”, lembra Marcelo Pollack, do Instituto de Relaciones Europeo-Latinoamericanas (Irela), em Madri. “Com a reação da opinião pública, ele teve de assumir posição de muito mais cautela.”

Já o brasileiro Paulo Wrobel, pesquisador do Royal Institute of International Affairs, de Londres, admite que o Home Office, o equivalente britânico do Ministério do Interior, possa ter agido de maneira a favorecer a abertura do processo de Pinochet. “Não acho que tenha sido necessariamente o caso”, pondera.

O fato é que a Justiça consultou o Foreign Office, o Ministério das Relações Exteriores, quanto à suposta imunidade conferida pelo passaporte diplomático de Pinochet, e a chancelaria negou a proteção, abrindo caminho para o processo.

 

Seja como for, só um elemento surpresa – e não tem havido poucos nesse caso — pode agora virar a sorte de Pinochet.

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