Pleito presidencial chileno vai a segundo turno

Apurados 99,33% dos votos, nenhum dos candidatos obteve maioria

 

SANTIAGO — A eleição presidencial no Chile será decidida no segundo turno, dia 16 de janeiro, depois de virtual empate entre os dois principais candidatos, segundo resultados parciais divulgados ontem, às 22h30 em Santiago (23h30 em Brasília). Apurados 99,33% dos votos, Ricardo Lagos, o candidato da coalizão de governo Concertación, estava na frente, com 47,96% dos votos válidos, seguido muito de perto por Joaquín Lavín, candidato da frente de direita Aliança pelo Chile, com 47,52%. A candidata do Partido Comunista, Gladys Marín, seguia num distante terceiro lugar, com 3,19%.

Os resultados parciais foram divulgados pelo subsecretário do Interior, Guillermo Pickering, enquanto a apuração continuava. Logo depois, Lagos leu um discurso, em que conclamou os chilenos à união.

Dando o tom do que será sua campanha para o segundo turno, em que procurará atrair os votos dados a Marín e a outros candidatos menores de esquerda, Lagos disse que a escolha será “entre um Chile débil e um Chile que protege os desvalidos, entre um país em que tudo é concorrência e outro em que haja fraternidade”.

Momentos antes, em entrevista coletiva, Marín responsabilizou a coalizão entre a Democracia Cristã e o Partido Socialista pelo avanço da direita nessa eleição. “Após dez anos de governo da Concertación, verificamos uma inclinação perigosa em direção à direita, graças à política conduzida por esse governo”, disse a candidata comunista.

O candidato humanista Tomás Hirsch, que teve 0,51% dos votos, foi na mesma linha: “O governo precisa refletir sobre o fato de que não conta mais com maioria significativa e sobre o avanço formidável da direita.” Lavín ainda não se havia pronunciado até as 21h30 (hora local).

Em 1993, os dois candidatos da direita, José Piñeira e Arturo Alessandri, tiveram, juntos, 34% dos votos. O presidente Eduardo Frei, da Concertación, foi eleito no primeiro turno, com 58%. No outro extremo do espectro ideológico, a votação do partido comunista diminuiu. Em 1993, o candidato comunista, o padre Eugenio Pizarro, teve 4,7% dos votos válidos.

Durante a campanha, Lagos, de 61 anos, formado em direito e doutor em economia pela Universidade de Duke, na Carolina do Norte, comprometeu-se com o equilíbrio fiscal e prometeu “crescimento com igualdade”, enfatizando a necessidade de promover melhor distribuição de renda.

Lagos, ex-ministro da Educação (1990-92) no governo do presidente Patricio Aylwin e de Obras Públicas (1994-98) no atual governo de Eduardo Frei, procurou realçar, na campanha, sua qualidade de político experiente e criar um perfil de “estadista”.

Vestido de terno escuro sob o sol forte da manhã de domingo, Lagos chegou às 10h30 para votar no Instituto Superior do Comércio, no centro de Santiago, declarando-se “tranqüilo e seguro”. “As coisas estão indo muito bem”, assegurou. “Não me cabe a menor dúvida (quanto à vitória).” Depois de votar, Lagos afirmou: “O Chile se reencontrou com sua história.” Lagos foi o primeiro candidato do Partido Socialista à presidência desde a eleição de Salvador Allende, deposto pelo golpe militar de 1973. “Durante 17 anos, não foi possível votar”, lembrou Lagos, referindo-se ao período da ditadura. Mas completou: “O Chile agora se volta para o futuro.” Lagos vinha se empenhando em exorcizar o estigma da esquerda preocupada em acertar as contas com o passado, da mesma maneira que Lavín, assessor econômico do governo militar, procurou desvincular sua imagem do ex-ditador Augusto Pinochet. Numa espécie de acordo tácito, os dois candidatos praticamente não falaram do passado durante toda a campanha.

Lavín, 46 anos, economista com mestrado na Escola de Chicago, o berço do monetarismo de Milton Friedman, também manteve firme compromisso com o equilíbrio fiscal e o crescimento econômico.

Ex-administrador da comuna de Las Condes, bairro elegante de Santiago, cargo para o qual se reelegeu em 1996 com 78% dos votos, Lavín procurou apresentar-se como candidato “do povo”, mais simples e informal, além de bom administrador.

Antes de votar, Lavín, membro do movimento ultracatólico Opus Dei, foi com a mulher, María Estela León, e os sete filhos a uma missa na Paróquia Santa Maria, em Las Condes. O candidato da Aliança pelo Chile chegou às 10h20 para votar na Scuola Italiana, em traje esporte, vestindo uma camisa amarela de manga comprida. Também declarando-se “confiante e tranqüilo”, ele acrescentou: “Espero que os chilenos joguem pela mudança.” Mais tarde, em entrevista ao canal TVN, Lavín disse que essa seria uma escolha “mais entre pessoas do que entre partidos”, garantindo que não faria um governo “político-partidista” e que vários democrata-cristãos lhe haviam dito que votariam nele. No epicentro da divisão da DC está o presidente do Senado, Andrés Zaldívar. O senador foi derrotado por Lagos na disputa pela candidatura presidencial, na primária da Concertación, em maio. O presidente Eduardo Frei, também da DC, é acusado de não se ter empenhado na escolha de Zaldívar. O senador, no entanto, reafirmou seu apoio a Lagos, ao votar, às 11h, também no Instituto Superior do Comércio.

Frei, por sua vez, enfatizou, depois de votar, às 13h15, na Scuola Italiana, o êxito da coalizão formada pela DC e o PS, que governa o Chile desde a restauração da democracia, em 1990. Foi a primeira vez que a DC apoiou candidato de outro partido à presidência, desde que foi fundada, em 1958.

 

Essa foi a primeira eleição presidencial chilena com candidatas mulheres. A outra, além de Marín, foi a ambientalista Sara Larraín, que teve 0,44% dos votos. O ex-democrata-cristão Arturo Frei Bolívar também obteve 0,38%.

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