Colômbia põe fim à mediação de Chávez para libertar reféns das Farc

Motivo teria sido telefonema não autorizado de presidente venezuelano a comandante do Exército colombiano

 

CARACAS

Um telefonema do presidente venezuelano ao comandante do Exército da Colômbia levou o país a pôr fim à mediação de Hugo Chávez para a troca de guerrilheiros presos por reféns das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). O governo colombiano fez o anúncio na noite de quarta-feira em Bogotá, ao mesmo tempo em que Chávez se vangloriava de seu papel como mediador, num discurso a cerca de 50 mil manifestantes diante do Palácio Miraflores, em Caracas.

Numa rápida conversa com Álvaro Uribe, durante a cúpula ibero-americana na semana passada em Santiago, Chávez perguntou ao presidente colombiano se podia conversar diretamente com o general Mario Montoya, comandante do Exército da Colômbia. Uribe disse a Chávez que não considerava conveniente, e que todos os contatos tinham de ser feitos entre os dois presidentes, segundo contou ontem o alto comissionado para a paz colombiano, Luis Carlos Restrepo.

Mesmo assim, a senadora colombiana Piedad Córdoba, que atua como mediadora entre Chávez e o comando das Farc, ligou para Montoya na quarta-feira, e passou o telefone para o presidente venezuelano. Chávez queria detalhes sobre as informações que o Exército tinha acerca da situação dos reféns na selva colombiana. Ele tinha estado, em Paris, com o presidente francês, Nicolas Sarkozy, e com parentes da ex-senadora e candidata a presidente colombiana Ingrid Betancourt, seqüestrada pelas Farc, que tem cidadania francesa. Haviam-lhe cobrado informações concretas.

“A decisão do presidente Uribe é orientada a preservar a institucionalidade democrática colombiana e nossa política de segurança democrática”, explicou ontem Restrepo, em entrevista ao canal de TV venezuelano Televen. “Para nós, esse é um ponto muito sensível, como já explicamos ao chanceler (venezuelano, Nicolás) Maduro.” 

Além disso, enfatizou o negociador colombiano, “o assunto tinha sido tratado entre os dois presidentes e Uribe havia dito ao presidente Chávez que não julgava conveniente que esses temas, que são da competência exclusiva do presidente da Colômbia, fossem objeto de comunicação direta entre o presidente da Venezuela e o comandante do Exército colombiano”. Restrepo disse ter recebido instruções de Uribe de seguir adiante com as negociações para a libertação dos reféns.

Na noite de quarta-feira, Chávez se mostrara empolgado com seu papel de mediador. “A Colômbia e a Venezuela somos uma só pátria”, discursou ele, no encerramento de uma manifestação a favor da reforma constitucional, que prevê a reeleição ilimitada do presidente e vai a referendo no dia 2. “Somos filhos de (Simón) Bolívar (líder da independência hispano-americana). Estou muito dedicado a buscar o acordo humanitário e a paz na Colômbia.”

No encontro em Paris, na terça-feira, Sarkozy não escondeu sua decepção com a falta de avanços concretos na mediação, incluindo provas de que Ingrid Betancourt e os cerca de 50 reféns estivessem vivos. Ontem, no entanto, Sarkozy encarregou o embaixador da França em Bogotá de entregar uma carta a Uribe pedindo que mantivesse a mediação de Chávez, segundo uma fonte em Paris, citada pelas agências internacionais. “Continuamos pensando que Hugo Chávez é a melhor opção para liberar Ingrid Betancourt e todos os reféns”, declarou o porta-voz do Palácio do Eliseu, David Martinon.

Ao que tudo indica, o telefonema de Chávez ao general foi a gota d’água. Desde o início da mediação, em agosto, as atitudes do presidente venezuelano vinham incomodando Uribe. Em Paris, ele se vangloriou de ter conseguido, em três meses, mais do que o governo colombiano obtivera em cinco anos. Além disso, Chávez insistia em se reunir com o líder das Farc, Manuel Marulanda, contra a vontade do presidente colombiano. “Uribe, deixe-me reunir-me com Marulanda”, repetia Chávez publicamente, em seu estilo pouco formal. 

 

“O protagonismo que essa mediação foi dando às Farc estava-lhes conferindo, na prática, o status de força beligerante”, analisou ontem Alberto Garrido, especialista venezuelano em assuntos militares. Desde governos anteriores, a Colômbia tem historicamente evitado conceder esse status à guerrilha, que lhe conferiria um caráter político e lhe daria direitos no âmbito da Convenção de Genebra. Garrido não via futuro nessa negociação, que esbarraria, por exemplo, na troca de quatro reféns americanos pelos guerrilheiros Simón e Sonia Trinidad, presos nos Estados Unidos. O governo americano considera as Farc grupo terrorista, e descarta a possibilidade de negociações

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