No golpe de 2002, Chávez ficou grato à CNN

Jornalistas estrangeiros trataram prisão do presidente como golpe, e não como renúncia

 

Os ataques do presidente Hugo Chávez à rede de TV americana CNN podem parecer hoje naturais, à luz de sua predileção por veículos de comunicação estatais, e de sua crescente intolerância a críticas. Mas nem sempre Chávez e seus simpatizantes pensaram mal da CNN e de outros meios internacionais e privados. Ao contrário. Chávez e seus partidários souberam apreciar o valor da mídia independente quando o presidente foi levado preso por militares golpistas e substituído pelo empresário Pedro Carmona, que dissolveu a Assembléia Nacional e fechou o Supremo Tribunal de Justiça, em abril de 2002. 

Os principais veículos venezuelanos trataram o sumiço de Chávez (levado a uma base militar) como “renúncia” e o governo de Carmona como legítimo. Enquanto isso, a CNN, assim como outros canais internacionais, as agências de notícias e os correspondentes e enviados estrangeiros tratavam o assunto como um golpe e tentavam cobrir a reação dos militares, ministros e parlamentares leais ao presidente. 

Indignados com a atitude em geral oposicionista da imprensa, os chavistas atacavam os jornalistas nas ruas com pedras e paus. Emissoras de TV foram cercadas e apedrejadas, e os principais jornais de Caracas não circularam. Os repórteres estrangeiros conseguiam salvo-conduto no meio da turba hostil mostrando suas credenciais internacionais.

Dentre os meios venezuelanos, apenas uma rádio católica noticiou quando os ministros de Chávez se reuniram no palácio, protegidos pela Guarda de Honra da Presidência, e articularam a retomada do poder, no sábado, 13 de abril de 2002. Na madrugada do domingo, centenas de chavistas festejaram o espetacular retorno do presidente, de helicóptero, ao Palácio Miraflores, depois de 48 horas preso pelos golpistas. Dançando ao som do oropo, a música típica dos Llanos (região natal de Chávez), alguns traziam cartazes agradecendo à CNN como “exemplo de jornalismo veraz e objetivo”. 

No dia seguinte, o próprio Chávez retribuiu com uma infindável entrevista coletiva aos jornalistas estrangeiros, no palácio, em que esmiuçou a aflição do cativeiro. Mas, num dramático pronunciamento à nação, segurando um crucifixo e pedindo a união dos venezuelanos, Chávez fez um anúncio premonitório: “Chegou a hora de modificações profundas nos meios de comunicação deste país.”

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