Freada chinesa não assusta empresários

Demanda descontrolada deve mesmo acabar, afirmam os brasileiros

As medidas que o governo chinês vem adotando para conter o superaquecimento da economia não preocupam as empresas brasileiras. “Não é a primeira vez que vou ler sobre isso nos jornais, seja da China ou de outros países”, diz Horácio Forjaz, vice-presidente de Comunicação Empresarial da Embraer, sócia de uma fábrica de aviões de US$ 25 milhões no norte do país. “Nada disso significará mudanças para nós.”

Estudos da Embraer estimam que, nos próximos 20 anos, a China vai necessitar de 635 novos aviões com 30 a 120 assentos – a faixa produzida pela empresa brasileira. A fábrica em Harbin, inaugurada em dezembro de 2003, fechou a primeira encomenda no início deste ano, de seis aviões ERJ-145, para a China Southern Airlines. Cada avião custa ao redor de US$ 20 milhões.

Outra empresa que não demonstra preocupação com as medidas do governo é a Companhia Vale do Rio Doce. “Com todas essas fofocas sobre desaceleração”, diz o diretor comercial da Vale, Nelson Silva, “estamos operando no limite de nossa capacidade, sem dar conta de atender a demanda da China”. A Vale exporta 31 milhões de toneladas de minério de ferro para a China – o seu maior mercado – de um total de 151 milhões de toneladas que a empresa vende por ano. Se ampliasse a capacidade, poderia vender mais 15 a 20 milhões, estima o diretor comercial.

Além disso, Vale vê com bons olhos o aumento do rigor na regulação do mercado chinês, que tem sido interpretado como outra forma de contenção do surto de crescimento. “Essa demanda descontrolada não pode continuar”, diz Nelson Silva. “O governo precisa organizar o jogo. A situação é muito confusa.” No ramo do minério de ferro, tem havido muitos movimentos especulativos, de empresas que operam no mercado à vista, com preços que flutuam ao sabor da forte demanda por insumos para a indústria.

Segundo Silva, os indianos são os que têm atuado mais nesse nicho. “É um mercado muito oportunista, com preços que não seguem regra alguma”, afirma ele. “Nós não gostaríamos que isso ocorresse.” Embora esse mercado secundário seja bastante lucrativo, a Vale prefere operar apenas com contratos de longo prazo, para grandes siderúrgicas, que requerem estabilidade no fornecimento. Hoje, a companhia é a terceira fornecedora de minério de ferro para a China, depois da Austrália e da Índia. Com a regulação e o aumento da demanda interna na Índia, a companhia pretende desbancar os indianos da segunda colocação.

Outra medida do governo interpretada como um eventual freio nas importações foi o anúncio de subsídios de US$ 3,75 bilhões este ano para a agricultura – o maior da história. A injeção de recursos, no entanto, deve aumentar a produção agrícola em apenas 20 milhões de toneladas – de 435 para 455 milhões. Mesmo assim, calcula-se que a China seguirá com um déficit anual de 100 a 150 milhões de toneladas de produtos agrícolas por ano.

A razão é simples: embora 900 milhões do 1,3 bilhão de chineses vivam na zona rural, o imenso país sofre de escassez de terras apropriadas para a agricultura. A China detém 7% das áreas agricultáveis do planeta, para alimentar 20% da população do mundo.

Essa é a equação chinesa, que nenhum decreto do governo poderá mudar.

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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