Palocci tenta desfazer mal-estar no Japão

A ida do presidente Lula à China ressuscitou a expressão ‘passar sobre o Japão’

TÓQUIO – O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, reuniu-se ontem em Tóquio com o ministro das Finanças do Japão, Sadakazu Tanigaki, e deu uma palestra a cerca de 130 investidores, traders e acadêmicos japoneses. Mas Palocci não veio ao Japão apenas para vender o Brasil aos investidores; sua missão foi também, num certo sentido, diplomática. A ida do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à China, sem passar pelo Japão, melindrou os japoneses.

“Muitos consideravam que, na esfera asiática, o Japão era prioritário para o Brasil”, disse Kotaro Horisaka, reitor da Faculdade de Estudos Estrangeiros da Universidade Sophia, de Tóquio. “O presidente Lula foi à China e, antes, à Índia. Para nós, parece que ele está esquecendo o Japão.”

O anúncio da visita de Lula à China ressuscitou a expressão “passar sobre o Japão”, usada durante o governo Clinton, quando o presidente americano passou, literalmente, de avião sobre o país, para ir à China. Lula tem viagem programada para Tóquio no início do ano que vem.

“O embaixador (do Brasil em Tóquio, Ivan Cannabrava) tinha telefonado para mim recentemente porque estávamos com uma dívida com o Japão, não apenas por ter ido a outros países recentemente, mas por não ter vindo aqui”, disse Palocci, ao sair da reunião com Tanigaki.

“Acertamos ter uma continuidade do relacionamento dos dois ministérios através das nossas áreas externas”, contou o ministro, salientando que o seu secretário de Relações Externas, Luís Pereira, trabalhou em Tóquio entre 1996 e 2000, no Ministério das Finanças e no Banco do Japão.

Segundo Palocci, o ministro japonês pediu detalhes sobre o “ajuste externo” brasileiro. “Eles têm consciência de que o Brasil pode crescer mais agora, e no momento que o Japão está crescendo também nós podemos solidificar alguns espaços de atuação conjunta importantes”, disse Palocci.

BOA IMPRESSÃO

A palestra de uma hora e meia, na sede do Banco do Japão para a Cooperação Internacional (JBIC), causou boa impressão aos participantes ouvidos pelo Estado. “Foi muito bom”, disse Suyama Kenji, vice-diretor de Estratégia de Indústria no Exterior da Prefeitura de Gifu, no centro do Japão. “Com a eleição de Lula, houve muito receio de que ele quisesse aumentar os salários e os gastos públicos”, confidenciou Kenji. “Mas não há problema nenhum, a economia está melhorando muito, e a comunidade financeira internacional reconhece isso.”

Ao fim da palestra, Palocci brincou que seus secretários de Relações Externas, Luís Pereira, e do Tesouro, Joaquim Levi, ali presentes, teriam muito o que falar, porque são economistas, enquanto ele é médico. Isso deixou Kenji intrigado. “O que ele fazia antes?”, perguntou ao repórter.

“Claro que há muito o que melhorar, mas, pensando nos últimos cinco anos, podemos ficar otimistas”, disse Kotaro Horisaka, reitor da Faculdade de Estudos Estrangeiros da Universidade Sophia, em Tóquio, e especialista em Brasil. “Os juros ainda estão num patamar muito alto, mas é preciso valorizar o esforço do governo, em reduzi-los de 27% para 16,5%.”

“Sem estabilidade não se pode fazer nada, mas, além disso, o Brasil precisa reestruturar sua economia, com uma reforma tributária e previdenciária” opinou Takuma Hatano, conselheiro corporativo da Mitsubishi. “Até aqui, o Banco Central do Brasil tem feito um bom trabalho, mas é preciso reativar o investimento, não só privado, mas também do governo, em infra-estrutura”, continuou Hatano. “O País precisa se abrir e tornar-se uma economia orientada para a exportação. Lula, como ex-sindicalista, é a pessoa certa para fazer isso.”

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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