Fotógrafo de Di falou com paparazzi

Era pouco mais de meia-noite quando David Chancellor saiu do cinema, em Londres, e religou o seu telefone celular. Passados alguns minutos, o celular tocou. Era um colega Francês

A ligação ruim e a voz nervosa realçavam o conteúdo aparentemente absurdo das frases ouvidas por Chancellor. A princesa de Gales tinha sofrido um violentíssimo acidente de carro e parecia estar morta, dizia o paparazzo francês, que ligou do local do acidente, minutos depois de ele ocorrer.

Chancellor, um dos principais fotógrafos da familia real, credenciado pelo Palácio de Buckingham, tinha fotografado Diana naquela semana, como fizera inúmeras vezes, na saída da academia de ginástica que ela freqüentava em Londres. Ele simplesmente não acreditou na história do colega francês. Ao chegar em casa, ligou para a central de informações da polícia parisiense. O operador disse que não havia registro de acidente de carro naquelas imediações, mas, diante da insistencia de Chancellor, anotou o número de seu telefone e prometeu verificar.

À lh30 de domingo em Londres, 21h30 de sábado em Brasília, o fotógrafo inglês obteve a confirmação da polícia francesa, mas numa versão que se revelaria fantasiosa e enganosamente otimista: tinha havido de fato o acidente, o motorista estava morto, Dodi al-Fayed estava gravemente ferido e Diana saira andando do carro – sã e salva… Chancellor continuou acordado, à cata de mais notícias. Somente às 4 horas de Londres, meia-noite em Brasília, o fotógrafo recebeu a confirmação definitiva, por outro telefonema, da morte de Diana.

Chancellor conversou com os outros fotógrafos franceses envolvidos, todos seus conhecidos, e confirma que a reação imediata deles foi rodear o carro destruído e fotografar, em vez de prestar socorro, como obriga a lei francesa. Ontem, essas fotos ainda eram ferozmente negociadas pelos agentes dos fotógrafos detidos.

Os colegas disseram-lhe no entanto que guardavam alguma distância do Mercedes, cujo motorista dirigia muito mal, era obviamente inexperiente e aparentemente não estava acostumado com aquele carro. Os fotógrafos explicaram a Chancellor que seguiam o carro não para tirar fotos no percurso, mas para saber onde o casal passaria a noite.

Sessenta e duas horas depois da primeira notícia do acidente, Chancellor ainda se mostrava confuso e chocado ontem, ao falar ao Estado, de Londres, pelo telefone. O experiente fotógrafo, há 15 anos especializado na familia real, tinha um convivio muito intenso com a princesa, alvo permanente dos paparazzi.

Seus flagrantes de Diana, negociados pela agencia Alph de Londres, percorreram o mundo nessa década e meia, alcançando frequentemente algumas centenas de milhares de dólares por unidade, pagas por tablóides ingleses e do continente, sequiosos de histórias picantes e de tudo o que se referisse à personagem mais glamourosa da nobreza britânica.

O trabalho tem levado Chancellor a todos os cantos do mundo. incluindo o Brasil, quando a princesa esteve aqui. “Viajei inúmeras vezes com Diana e em diversas ocasiões passamos por situações de risco, mas sempre acreditei que com a princesa de Gales nada poderia acontecer”, diz o fotógrafo. “Diana supostamente teria de estar sempre com os melhores guarda-costas, o melhor motorista, o melhor carro, o avião mais seguro que poderiam existir.”

Chancellor considera “surrealista que Diana possa ter morrido num acidente de carro que matou três pessoas, sem envolver outro veículo, com um motorista alcoolizado”. O fotógrafo tem a mesma idade de Diana, 36 anos, e mostrou-se também perplexo com a morte de uma pessoa tão nova por uma causa tão brutal e absurda – pelo menos para os padrões da Europa Ocidental, onde o trânsito não tem a feição selvagem assumida no Brasil.

Chancellor confirma que a notícia de que o motorista estava alcoolizado trouxe certo alívio para a categoria. Entretanto, o fotógrafo não tem dúvidas de que “a curto prazo o episódio vai afetar enormemente a profissão, porque este é o momento de encontrar alguém para culpar pela morte de Diana, e o alvo lógico são os jornalistas”.

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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