Vinda de presidente egípcio abre portas para o Brasil

A visita do presidente egípcio, Mohamed Morsi, ao Brasil abre portas importantes para os dois países. Como integrante do grupo fundamentalista Irmandade Muçulmana e governante de um país que tradicionalmente exerce liderança no mundo árabe, Morsi é um interlocutor valioso para o governo brasileiro, no que diz respeito à Primavera Árabe. Por sua vez, o Brasil representa para o Egito uma porta de saída do alinhamento com os Estados Unidos, herdado da política externa de Hosni Mubarak.De acordo com o jornal estatal egípcio Al-Ahram, Morsi deseja incluir o Egito no grupo Brics, que reúne Brasil, Rússia, China e África do Sul, conferindo a seu país o status de representante árabe dos emergentes. O porta-voz do Itamaraty, embaixador Tovar da Silva Nunes, disse ao Estado que o tema não foi levantado por Morsi na reunião de quarta-feira com a presidente Dilma Rousseff. “Não existe debate bilateral sobre isso”, disse ele. “Qualquer decisão de aceitar outros países será coletiva. É um sinal de reconhecimento do papel do grupo que outros países queiram se associar.”

“Trata-se de uma verdadeira reformulação da política externa do Egito”, disse ao Al-Ahram um diplomata egípcio. “É uma mensagem a todos os interessados, incluindo Washington, de que o Cairo mantém suas opções bem abertas e que não pretende mais sucumbir à moldura tradicional de sua política externa pré-revolucionária.”

Visitado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2003, Mubarak rejeitou convite para a reunião de cúpula entre América do Sul e países árabes, em 2005, em Brasília. Morsi foi o primeiro chefe de Estado egípcio a visitar o Brasil. O diplomata observou que Mubarak considerava suficiente ter boas relações com os EUA, dos quais os países latino-americanos, eram, na sua visão, seguidores. “Isso se aplica a alguns países e não a outros – o Brasil é certamente um país independente.”

A ascensão de Morsi ao poder é produto de uma revolução pacífica. Mas filiais locais da Irmandade Muçulmana ou grupos com ideologias semelhantes lutaram na Líbia e ainda lutam na Síria para derrubar ditaduras seculares como a de Mubarak. O Brasil tem resistido à interferência externa, que foi, na Líbia, e seria, na Síria, decisiva para a vitória dos insurgentes. Os discursos de Dilma e Morsi convergiram em Brasília, para a condenação da violência contra civis.

Tovar chama a atenção para o fato de o secretário de Estado americano, John Kerry, e o chanceler russo, Serguei Lavrov, reunidos na terça-feira em Moscou, terem evocado o Comunicado de Genebra. Firmado em junho pelos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança, mais a Liga Árabe e a Turquia, o acordo previa o fim imediato das hostilidades de ambos os lados e o estabelecimento de um governo de transição, com a participação do regime e da oposição. “O ministro Antonio Patriota era um dos raros chanceleres a insistir no comunicado”, lembrou o porta-voz. “Estamos satisfeitos em ver que nossa insistência deu frutos.” À pergunta sobre se o Brasil aceitaria uma transição sem o presidente Bashar Assad, como propõe Kerry, Tovar respondeu: “Se for essencial e surgir do diálogo, sim.”

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