Rebeldes líbios dizem não estar assustados com avanço de ditador

Para insurgentes, ditador pode conseguir retomar cidades do leste, mas não será capaz de manter a ocupação

TOBRUK, Líbia – Os avanços das forças do ditador Muamar Kadafi não impressionam militares da ativa e da reserva em Tobruk, 500 km a leste de Benghazi. “Kadafi pode até retomar as cidades do leste, mas é impossível para ele manter a ocupação, porque aqui todos os moradores apoiam a revolução, e têm armas para lutar contra ele”, afirma o capitão-de-fragata Mahmud Rabia, de 52 anos, da ativa na Marinha líbia. “Ele pode obter vitórias graças ao armamento que tem, mas nosso povo o matará na cama dele.”

Se a comunidade internacional não impuser a zona de exclusão aérea nem fornecer armas aos rebeldes, Rabia acredita que o conflito evoluirá para uma guerra de guerrilha. Ele diz que as derrotas ocorridas no campo de batalha, com os combatentes tentando avançar em linhas de frente, como numa guerra convencional, em vez de usar táticas de guerrilha, mais apropriadas diante da inferioridade de seus armamentos, são explicáveis pelo fato de que “no sangue do povo está fervendo o desejo revolucionário”. O capitão-de-fragata diz que, depois de 42 anos de opressão, as pessoas “querem morrer enfrentando as forças de Kadafi de peito aberto”. “É uma revolução”, pondera.

Mas os militares da ativa e da reserva têm-se agora engajado mais na guerra civil, orientando os combatentes civis sobre as táticas de batalha, disse um major da reserva do Exército, que pediu para não ser identificado. Segundo ele, o que motivou os militares a envolver-se mais no conflito foram os ataques das forças de Kadafi às instalações petrolíferas e também a bases militares em Benghazi, a principal cidade do leste e segunda maior do país, com 1 milhão de habitantes.

“Os militares de Kadafi não lutam com o coração”, disse o capitão da reserva Abdullah Mir, de 65 anos. Mir conta que serviu no Exército durante 41 anos e, quando deu baixa, não recebeu nada de direitos trabalhistas. “A maioria dos militares é composta de líbios, e eles não querem matar outros líbios.” Kadafi usou também mercenários africanos.

Os oficiais afirmam que os militares das forças de Kadafi lutam forçados, e sob ameaça de que suas famílias sejam castigadas se eles não obedecerem ordens. Segundo eles, os pilotos voam sem pára-quedas, para evitar o risco de desertarem, e os comandantes de tanques são algemados a seus veículos. Mesmo assim, disse Mir, 107 militares, a maioria líbios, foram presos por se recusarem a disparar contra seus compatriotas.

Enquanto os militares conversavam com o repórter do Estado, na praça da Mesquita Rei Idriss, um homem chamado Hamdi, de 32 anos, apresentou-se: “Eu era da Brigada Omar Mokhtar e nos recusamos a abrir fogo contra o povo.” Ele diz que o contingente era de 1.500, entre soldados e oficiais. Cerca de 500 foram lutar em Ras Lanuf e Brega. Os outros estão em Tobruk, prontos para defender a cidade, disse ele.

Cerca de 300 pessoas realizaram no fim da tarde na praça um protesto contra o assassinato de um cinegrafista da TV Al-Jazeera, no sábado, e pela renúncia de Kadafi. O colégio que dá de frente para a praça, usado como quartel-general dos “shebab” (jovens), os oposicionistas, foi batizado com o nome do cinegrafista, Ali Hassan al-Jaber, morto quando o carro da equipe da televisão foi atacado, na entrada de Benghazi.

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