Resultado das urnas surpreende analistas

Observadores acreditam em fraude e preveem dificuldade para líder contornar crise

TEERÃ – O resultado das eleições anunciado pelo Ministério do Interior chocou observadores independentes ouvidos pelo Estado. Antes da votação, alguns estavam otimistas quanto à possibilidade de uma eleição limpa. Depois dela, não têm dúvida de que foi fraudada. Perplexos, eles tinham dificuldade ontem de articular um cenário futuro, mas concordaram que o presidente Mahmud Ahmadinejad não terá facilidade de empurrar essa vitória goela abaixo dos iranianos.

“Todo mundo está chocado e não sei o que acontecerá”, disse Rajab Ali Mazrooei, presidente da Associação de Jornalistas do Irã. O Estado perguntou se não seria possível que a impressão que se tem em Teerã, de amplo favoritismo do candidato oposicionista Mir Hossein Moussavi, não se repetisse no resto do país, tornando plausível a vitória de Ahmadinejad. “Não”, respondeu Mazrooei. “Em Esfahan, Shiraz, Tabriz, Mashhad, todas as grandes cidades iranianas, a sensação era a mesma.”

“Acho que o povo dessa vez vai reagir”, disse Mazrooei, comparando a situação com o desapontamento depois do fracasso do presidente Mohammed Khatami (1997-2005) em vencer a resistência dos conservadores e promover as reformas para as quais fora eleito. O desalento levou muitos reformistas a não votar em 2005, facilitando a eleição de Ahmadinejad. “Dessa vez, eles votaram, e se sentem roubados.” A previsão dos analistas era de que um alto comparecimento favoreceria Moussavi. Ele atingiu 82%, mas o oposicionista foi derrotado por 63% a 34%, segundo a Comissão Eleitoral.

Mazrooei considera difícil prever o rumo que o presidente deverá tomar a partir de agora, depois de ter radicalizado o seu discurso contra os adversários, acusando de corrupção o ex-presidente Ali Akbar Hashemi Rafsanjani, um dos clérigos e políticos mais influentes do país, que articulou o apoio de conservadores e reformistas a Moussavi. “Ahmadinejad é um homem imprevisível”, diz ele. “Não acho que será fácil para o governo. Podem até voltar atrás, recontar os votos ou fazer nova eleição. O povo não vai aceitar Ahmadinejad como presidente.”

“Antes eu pensava que Ahmadinejad radicalizaria, mas a vitória dele será muito contestada, e talvez ele tenha até de assumir uma posição mais moderada, para apaziguar os ânimos”, diz Mashalah Shamsolvaezin, porta-voz do Comitê pela Liberdade de Imprensa. “É uma vitória muito temerária. Os políticos sabem que ele ganhou de maneira muito crítica. Talvez ele tenha de agir de forma conciliadora.”

A possibilidade de fraude não o surpreende, no entanto. “Para mim, a perspectiva de uma eleição justa é que era muito pequena.” Diante da precariedade da posição do presidente, Shamsolvaezin acredita que ele se tornará ainda mais dependente do líder supremo, Ali Khamenei. Ahmadinejad vinha procurando um vínculo direto com a população, para alçar voo próprio, apesar de as decisões importantes de Estado, como política externa e defesa, terem de passar pelo crivo do líder. Mas, na visão de Shamsolvaezin, apesar do “estranho resultado”, as eleições mostraram que Ahmadinejad não tem toda essa popularidade.

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