‘Só nos divertimos entre quatro paredes’

Embora critique controle de costumes, classe alta aprova política nuclear

TEERÃ – O shopping Tandis Center, no bairro de classe alta de Tadirish, norte de Teerã, é o mais luxuoso da cidade. Aqui, moças e rapazes com roupas e acessórios de grife percorrem distraidamente as vitrines da Benetton, Diesel, Dior e Mont Blanc, como se estivessem numa cidade grande qualquer, a não ser por alguns detalhes: o véu cobrindo os cabelos das mulheres, batas em lugar de blusas justas e nada de pernas de fora – restrições que as reformas da época do ex-presidente Mohamad Khatami (1997-2005) não aboliram.

Neste templo do consumo, as pregações do aiatolá Ahmed Djanati não encontram ressonância; seu sistema moral se observa nas aparências, não por adesão, mas por imposição. “Nossa diversão só pode ser entre quatro paredes”, diz uma consultora de investimentos de 34 anos, que prefere não dar seu nome, e só se deixa fotografar detrás dos óculos escuros – além do véu.

“Todo mundo está descontente, mas não podemos fazer nada, por causa do controle do regime”, acrescenta. “Se dizemos algo, vamos para a prisão. Só pelo fato de estar aqui falando com você, se alguém nesta cafeteria for um policial à paisana, me leva de carro e me interroga sobre o que estava dizendo.”

“Infelizmente, os iranianos médios têm um nível de educação muito baixo, sua opinião é baseada no que ouvem e lêem, e eles adoram (o presidente Mahmoud) Ahmadinejad”, diz uma psicóloga de 30 anos, que também não quer identificar-se. “Ninguém tem idéia do que realmente o governo pretende, e todos preferem calar-se e tocar a vida.”

Ainda assim, as duas elogiam o relaxamento das normas de conduta dos últimos três ou quatro anos. “Outro dia, vi uma moça com os cabelos compridos fora do véu”, surpreende-se a consultora. “Também já se vêem homens e mulheres andando de mãos dadas.” Sempre há o risco de um basidji (guardião da moral) ou um policial exigir documentos. Se não provar que são casados, pai e mãe ou irmãos, um casal pode ter de pagar multa. Até nos ônibus e nas praias, homens e mulheres ficam separados.

Mesmo entre os iranianos que se sentem oprimidos pelo regime, no entanto, não é comum ouvir críticas ao programa nuclear. Ao contrário, eles vão além do que se costuma dizer em público: que seus fins devem ser necessariamente pacíficos. “Por que não podemos ter energia nuclear ou mesmo a bomba atômica? Por que ninguém diz isso a Israel?”, pergunta a consultora. “É um direito de nosso país. Ninguém tem nada com isso.”

Embora não estejam contentes, esses iranianos também não se animam com uma hipotética troca de regime patrocinada pelos EUA. “Quando o xá caiu (1979), houve esperança de que a mudança seria para melhor, e não foi”, explica a consultora. “E, agora, vimos também o desastre que foi no Iraque.”

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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