Arsenal químico é improvável, diz brasileiro

Para o especialista José Maurício Bustani, seria “muito difícil” o Iraque fabricar essas armas

É muito pouco provável que o Iraque tenha retomado ou seguido adiante com seu programa de armas químicas, desde o fim da Guerra do Golfe, em 1991. É o que afirma o brasileiro José Maurício Bustani, diretor-geral da Organizacão para a Proibição de Armas Químicas (Opaq), organismo da ONU. Com um regime de sanções e de verificacões como o imposto ao Iraque pelo Conselho de Segurança da ONU há sete anos “é muito difícil” para um país fabricar armas químicas, avalia o especialista. “Pode até ser, mas é bem complicado.” A possibilidade de o Iraque continuar fabricando armas químicas é o pretexto apresentado pelos EUA para um eventual bombardeio.

“Ninguém pode negar que o Iraque tenha a capacidade de voltar a fabricar esse tipo de armas, porque os cientistas que trabalhavam nesse projeto estão lá, não morreram”, resta salvou Bustani, em entrevista ao Estado, de Haia, sede da organização. Além disso, o especialista diz que não conhece em detalhes o tipo de evidências nas quais os inspetores da ONU se baseiam para afirmar que falta o Iraque prestar contas sobre determinada quantidade de material utilizável na fabricação de armas de destruição maciça. O Iraque não é membro da Opaq e está sob regime especial de verificação do Conselho de Segurança da ONU.

Uma coisa é o Iraque ainda ter em estoque material comprado antes da Guerra do Golfo. Outra é o país continuar fabricando armas químicas e bacteriológicas. Os inspetores podem até dispor de documentos de exportação de outros países mostrando que o Iraque comprou, antes da guerras produtos químicos e equipamentos utilizáveis na fabricação de armas em quantidade maior do que a que foi declarada aos inspetores. Difícil de imaginar é que, com o bloqueio e a vigilância constante, essa fabricação tenha prosseguido, despercebida, nos últimos sete anos.

Bustani cita o exemplo do gás sarin, usado no atentado contra o metrô de Tóquio, em 1995: “Para fabricar-se um gás desse é necessária uma instalação grande, não um fundo de quintal.” Ou seja, é uma atividade visível. O gás sarin de Tóquio destinava-se a uma ação terrorista. Um programa militar conduzido por um país teria escala e visibilidade muito maiores. As alegações americanas a cerca do descumprimento, pelo Iraque, das condições da ONU têm variado drasticamente. A cada hora, os EUA alegam uma coisa. Mas vez por outra como nas últimas semanas, os americanos têm falado da possíveI continuidade do programa iraquiano de armas de destruição maciça.

Não é só o diretor-geral da Organização para a Proibição de Armas Químicas, que conta com 106 membros, entre eles o Brasil, que desconhece os detalhes acerca das evidências com que trabalham os inspetores da ONU. Mesmo a imprensa especializada em armamentos trabalha com os resultados finais dos levantamentos apresentados pela comissão especial ao Conselho de Segurança e divulgados, em segunda mão, pelos Estados Unidos e outros membros permanentes. Não existe fonte de informação independente acerca da situação no Iraque. E os interesses políticos, de todos os lados, são enormes.

No mundo árabe, sobretudo nas camadas mais populares, um constante fator de desgaste e ressentimento é o contraste entre o rigor ap]icado sobre o baque e a condescendência para com Israel, notório detentor de armas químicas. No ano passado, o governo israelense ensaiou aderir à Convenção de Armas Químicas, mas recuou. Dos 106 membros da Opag apenas 3 declaram possuir armas químicas: EUA, Rússia e Índia. Esses países têm até 2010 para eliminar os arsenais químicos. O prazo deverá ser prorrogado.

O Ira e o Paquistão aderiram e tudo indica que não possuam armas químicas. A adesão à convenção submete o país a um regime de vigilância e verificação que, segundo Bustani, torna impossível a manutenção de arsenal químico não-declarado. Outros seis países, não membros da Opaq, têm capacidade de fabricar armas químicas. Bustani não revela quais são, mas Iraque e Israel estão entre eles. Quanto às armas bacteriológicas, discute-se uma convenção nos mesmos termos da que proscreveu as químicas.

Publicado no Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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