Saúde de Arafat levanta dúvidas sobre futuro

Transição até o surgimento do Estado Palestino ainda confere papel vital ao líder da OLP, que sofreu recente mal-estar no Cairo e reacendeu a polêmica da sucessão

O recente mal-estar de Yasser Arafat, durante reunião de cúpula no Cairo, reacendeu uma polêmica quase tão antiga quanto a própria OLP: o que será do movimento palestino na ausência de seu carismático líder? A dúvida ainda é pertinente, mas as extraordinárias mudanças representadas pela paz com Israel e a instituição do regime de autonomia nos territórios ocupados deram conotações muito diferentes à correlação do papel simbólico e das funções práticas de Arafat.

“Estamos num momento intermediário, mas quando tivermos instituições democráticas funcionando plenamente, um Estado independente, liberdade sindical e de expressão, em suma, com o fim da ocupação israelense, não precisaremos mais de símbolos nacionais e de salvadores”, prevê Ahmed Sobeh, diretor de Relações Internacionais da Autoridade Palestina, falando ao Estado de Ramallah, na Cisjordânia. “Se pudermos realizar eleições regularmente, consolidaremos costumes democráticos como o multipartidarismo, e surgirá espaço para novas caras, idéias e partidos.”

Esta é uma visão possível e talvez provável no horizonte palestino, mas ainda não é a paisagem dos territórios autônomos. Mesmo nas últimas semanas, momentos delicados deram a Arafat a oportunidade de demonstrar o quanto ele ainda é vital na equação palestina.

As bombas israelenses da desastrada e trágica operação Vinhas da Ira caíam sobre o Líbano quando o líder palestino reuniu o Conselho Nacional Palestino (o Parlamento no exílio) para eliminar da Carta da OLP a defesa da luta armada para destruir o Estado de Israel. A medida era precondição israelense para levar adiante o processo de paz. Dias depois, em reconhecimento, Arafat era recebido na qualidade de “líder nacional” pelo presidente Bill Clinton na Casa Branca.

A reafirmação da liderança de Arafat no CNP depois da instalaçao do regime de autonomia foi significativa porque os acordos com Israel que possibilitaram esse regime ferem antigos dogmas alimentados pelos palestinos da “diáspora, representados naquele Conselho. Na prática, a retirada parcial de Israel, com a manutenção dos colonos judeus nos territórios, torna ainda menos viável o chamado “direito de retorno” dos exilados e refugiados, por absoluta falta de espaço vital.

Arafat personifica o amálgama entre os 2 milhões de palestinos dos territórios e os 4 milhões da diáspora, sujeito a fissuras nesse momento de transformação, como testemunham os atentados do Hamas e da Jihad Islâmica, reprimidos pela polícia palestina em coordenação com o antigo inimigo, o Exército israelense.

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