Índios sentem-se roubados por brasileiros e estrangeiros

BRASÍLIA – Por volta de 1992, uma equipe de pesquisadores italianos freqüentou as aldeias dos culinas e dos marubos, no Vale do Javari, oeste do Amazonas.

 Em troca de presentes, foram instruídos pelos pajés sobre o uso da secreção de uma espécie de sapo da região. Os índios queimam a ponta do cipó para furar a pele e aplicar esse líquido, que tira a dor. O produto foi convertido em poderoso analgésico e patenteado na Europa.

Durante a Jornada sobre Acesso a Recursos Genéticos e Conhecimentos Tradicionais Indígenas, no início de dezembro de 1997, o índio Álvaro Tucano, de São Gabriel da Cachoeira, no Alto Rio Negro, Amazonas, contou que, conversando com seu pai, Axkito, conseguiram enumerar 42 plantas medicinais existentes em sua reserva e enunciou a lista delas.

“Os estudos realizados por nossos antepassados levaram milhares de anos”, disse Álvaro. “Por isso, toda vez que chega o pesquisador que quer tudo prontinho, achamos ruim e somos roubados pelos entrangeiros e brasileiros”, continuou. “Eles, depois que se tornam doutores, fogem dos velhos amigos ou nunca nos dizem para que serviu a pesquisa.”

A Funai recebeu recentemente um pedido de autorização da multinacional francesa de cosméticos Yves Rocher, para entrar com uma equipe de botânicos, zoólogos e “perfumistas” — três franceses, dois americanos e quatro brasileiros -, para “ampliar o conhecimento sobre a composição florística e a fauna do Parque Nacional do Pico da Neblina” e “identificar plantas que possuam características olfativas peculiares e apropriadas para a criação de novas fragrâncias”. A embaixada da França pressiona pela concessão da autorização.

A concorrente americana da Yves Rocher, a Aveda, já tem os pés solidamente plantados na Amazônia legal. Já em 1994, a Aveda lançava batons à base de urucum e babaçu, “com cores totalmente naturais da floresta tropical brasileira”, segundo campanha publicitária na época. Aparentemente, esse produto foi resultado de extração na Reserva Iauanauá, no Acre, já que consta dos arquivos da Funai um pedido de janeiro de 1995 para equipe da empresa visitar essa área, para “avaliar os resultados do projeto de plantio de urucum financiados pela Aveda e esboçar sua segunda etapa.”

Em 1994, teve início projeto noutra reserva, dos guaranis e caiouás, próximo a Dourados, Mato Grosso do Sul, para explorar o urucum. Em nenhum dos dois casos foi firmado convênio com a Funai nem estipulada porcentagem de participação dos índios nos lucros. A retribuição veio na forma da construção de casas.

 

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