Proselitismo católico não rende voto

A presença avassaladora de deputados evangélicos engajados, em comparação com católicos…

e em contraste com o perfil religioso da população, não reflete só o crescimento do protestantismo no País, mas a diferença na atuação política dos dois grupos.

É o que dizem os especialistas em relações entre política e religião ouvidos pelo Estado.

“A Igreja Católica proíbe a participação de sacerdotes na política partidária. Ela apenas orienta sobre o perfil dos candidatos”, diz Ricardo Mariano, da PUC-RS. Em muitos templos evangélicos se faz campanha para candidatos, embora isso seja proibido por lei. Além disso, a presença católica está “naturalizada” no Brasil, o que facilita o lobby e a atuação de lideranças católicas em espaços públicos.

“Os católicos não precisam acionar sua identidade religiosa porque são maioria”, analisa Maria das Dores Campos Machado, da UFRJ. “Não precisam bater na tecla de sua diferença, assim como brancos ou homens não precisam ficar lembrando o que são. Os minoritários é que dão visibilidade a seu caráter distintivo.” Além do embate moralista com feministas, homossexuais e seculares em geral, observa, os evangélicos têm um incentivo a mais para se mobilizar: a concorrência entre as inúmeras correntes evangélicas, que disputam visibilidade, verbas, concessões públicas e benefícios que se buscam nos parlamentos.

Não que nenhum parlamentar católico atue de forma ostensiva. Antonio Augusto de Queiroz, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar, lembra que, até a legislatura passada, havia uma frente carismática – corrente católica conservadora – no Congresso. Entretanto, ela se desfez. Hoje, há dois deputados federais padres, ambos petistas da ala “progressista”: Padre João (MG), ligado aos sem terra, e Padre Ton (RO), vinculado aos direitos indígenas. Os carismáticos têm apelo limitado dentre os católicos, e foram “enquadrados pela cúpula da Igreja, que coibiu excessos na liturgia”, recorda Mariano.

“Fazer proselitismo em favor da Igreja Católica não dá voto”, diz Ronaldo Almeida, da Unicamp e do Cebrap. Além disso, dizem os especialistas, a Igreja Católica é capaz de influir em instituições importantes além do Congresso, como o Supremo Tribunal Federal, que decide sobre temas caros para religiosos conservadores. “Para que um ministro do STF seja indicado por evangélicos, é preciso mudar o País”, diz Almeida.

Minorias. A concentração de forças evangélicas no Legislativo tem uma explicação. “Deputados podem se eleger exclusivamente com votos de evangélicos. Nas eleições majoritárias dependem de apoio mais amplo”, diz Paul Freston, professor da Universidade Federal de São Carlos. A Frente Parlamentar Evangélica reúne 72 deputados federais (14% das cadeiras da Casa) e 4 senadores (5%).

Freston lembra que, em 2002, o hoje deputado Anthony Garotinho (PR-RJ) obteve votação expressiva na eleição presidencial – 18%, ficando em terceiro lugar. “Ele usou sua identidade evangélica para ficar mais conhecido nacionalmente. Mas, se tivesse ido para o segundo turno, teria de ter feito campanha diminuindo a ênfase de – não negando – sua identidade religiosa.”

A senadora Marina Silva (AC) alcançou patamar semelhante – 19%, também terceiro lugar – em 2010, mas, embora sabidamente evangélica, não fez campanha calcada nessa identidade, “recebeu votação expressiva de outros setores da população e votos de evangélicos na média da população do País”, conclui Freston.

Apresentados sem essas nuances, esses dados preocupam Christina Vital, pesquisadora do Instituto de Estudos da Religião. “Podem pensar que a presença católica na política está diminuída, e que os evangélicos são superpoderosos”, adverte Christina, coautora do livro Religião e Política. Ela teme que, em face dessa percepção de poder, os governantes façam concessões em troca do apoio dos evangélicos, como fizeram o ex-presidente Lula com o PRB, da Igreja Universal, e agora o governador Geraldo Alckmin com o PSC, da Assembleia de Deus.

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