Ocupações irregulares desorganizam sistemas viários

Ligações entre bairros de uma mesma região são um dos grandes desafios do transporte público de São Paulo

Assim como é desejável que se criem “novas centralidades” na cidade, como dizem os urbanistas, é evidente também que os moradores de São Paulo têm de poder deslocar-se, e para isso dispor de um transporte público digno do nome. “É possível promover maior mistura de trabalho, educação, consumo, moradia e outras atividades urbanas, mas isso não vai evitar que as pessoas circulem de lá para cá e atravessem a metrópole de São Paulo todos os dias”, diz o urbanista Anderson Kazuo Nakano, do Instituto Pólis. “As pessoas buscam oportunidades em diferentes locais da metrópole e não somente nas proximidades das suas casas.”

O Estado percorreu a periferia e o centro da cidade nos horários de pico, e constatou que os terminais funcionam relativamente bem. O gargalo está nos pontos de ônibus fora deles, sobretudo nos percursos intermediários, e nas ligações entre bairros de uma mesma região – um velho problema da cidade. Nakano observa que, na Região Metropolitana de São Paulo, a proliferação de loteamentos irregulares e de favelas, sem nenhum planejamento, levou a sistemas viários locais, de interligação entre bairros vizinhos, bastante truncados.

“Ao longo dos anos investimos em grandes avenidas e eixos de transporte coletivo que procuram atacar os problemas das macro-acessibilidades (unindo regiões, distritos e municípios) a partir de eixos que, muitas vezes, estão em conflito com os sistemas viários locais”, diz o urbanista. A ocupação tende a estender-se ao longo desses grandes eixos, sobrecarregando o seu trânsito e impedindo o fortalecimento de redes locais de transportes, serviços, comércio e, com eles, trabalho, consumo e lazer.

Na zona leste de São Paulo, por exemplo, há poucos eixos norte-sul (Avenida Aricanduva, Jacu-Pêssego) e predominância dos eixos leste-oeste (Avenida Celso Garcia, Radial Leste, Sapopemba, São Miguel, linha do metrô e trens da CPTM). “Isso faz com que seja difícil você ir, por exemplo, da Cidade Tiradentes para Lajeado, ou de São Mateus para a Penha”, descreve Nakano. É preciso ir a subcentros e ao próprio centro e voltar.

“Muitos falam que temos de avançar mais na integração entre planejamento e gestão da mobilidade, da acessibilidade e dos padrões de uso, ocupação e parcelamento do solo urbano, mas pouco se fez no sentido dessa integração”, constata o urbanista.

A resposta do prefeito Gilberto Kassab a esses problemas é o metrô. “O desenho da rede de metrô vai fazer as ligações perimetrais que não havia, formando anéis”, disse ele ao Estado. “Com o tempo, vai-se preencher as lacunas.” Kassab ressalta que, depois de 30 anos em que o metrô foi incumbência do Estado, a Prefeitura de São Paulo investiu R$ 1 bilhão no seu primeiro mandato e investirá outro bilhão até o final de sua segunda gestão, em 2012.

O urbanista Jaime Lerner não vê o metrô como solução. “Há um falso dilema entre carro e metrô. Nem um nem outro”, descarta. “As cidades hoje não vão construir redes completas de metrô.” Londres, Paris, Moscou e Nova York construíram as suas há mais de 100 anos, quando não existia ônibus e era mais barato trabalhar no subsolo. “Hoje, é impossível”, diz o urbanista. “Em São Paulo, 84% dos deslocamentos são na superfície, e continuarão assim”. Lerner, que há quase quatro décadas introduziu os corredores de ônibus e o sistema integrado de transportes em Curitiba, hoje imitados em várias partes do mundo, defende “metronizar” a superfície, ou seja, dar aos deslocamentos nela qualidade de metrô.

Apesar de sua predileção pelo metrô, Kassab tem lançado mão do monotrilho, um trem sobre pneus que trafega sobre vias elevadas exclusivas para ele, e sem cruzamentos. “Não é tão veloz quanto o metrô, mas muitas vezes superior ao ônibus em conforto e velocidade”, elogia o prefeito. O primeiro deles será o Expresso Tiradentes, na zona norte, investimento de R$ 1 bilhão da Prefeitura e mais parceria com governo do Estado. O segundo será o Corredor Zona Sul, de 34 km, com participação da iniciativa privada. Já o Corredor da Avenida Celso Garcia deverá ser um metrô subterrâneo. Segundo Kassab, juntos, os três devem beneficiar 2 milhões de pessoas.

Quanto aos bairros, o prefeito argumenta que os corredores de ônibus também fazem a sua integração. Além disso, o secretário dos Transportes, Alexandre de Moraes, diz ter autorizado a substituição de 87 a 89 micro-ônibus por veículos chamados de “micrões”, que têm 30% a mais de capacidade. A razão de não substituí-los por ônibus é a dificuldade de fazer curvas em alguns locais da periferia.

Outro problema é o próprio trânsito, que não afeta apenas os automóveis, mas também os ônibus. Moraes diz que, para aumentar a vazão dos ônibus, tem proibido o estacionamento em várias regiões da cidade. Na Rua Augusta, por exemplo, o trajeto caiu de 54 para 30 minutos, em média. Quando o Trecho Sul do Rodoanel estiver pronto, no fim de março, a Prefeitura vai impedir a circulação de caminhões em horários de pico em vias como as Marginais, a Avenida dos Bandeirantes e a Salim Farah Maluf, para liberar as pistas para os ônibus.

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