Mesquita do Hezbollah recebe ajuda do Brasil

Danificada na guerra com Israel, ela é reformada com dinheiro enviado pela comunidade xiita no Brasil e no Paraguai

 

BEIRUTE

São 17h20 no horário de inverno libanês, e a noite já caiu sobre Beirute. Sete garotos, na faixa dos 12 anos, saem da oração vespertina na mesquita Al-Mahdi al-Muntasar empunhando uma bandeira verde-amarela do Hezbollah. Os fiéis calçam seus sapatos e cruzam o grande vão sob a fachada em reforma. Alguns depositam dinheiro num dos três cofres de arrecadação de donativos, à sua esquerda. 

Um azul, com duas mãos amarelas em forma de oração, diz: “A caixa da caridade e da bondade.” Noutra caixa, de vidro, está escrito que o dinheiro é para ocasiões especiais. A terceira, branca com letras vermelhas, tem um destino mais específico: “A Resistência é seu orgulho, portanto, apóie-a.” Na parede ao lado, Hassan Nasrallah, o líder do Hezbollah, aparece em fotos com um olhar paternal dirigido a fotos de “mártires”, homens mortos na “resistência” contra Israel – a causa que faz jus à existência do “Partido de Deus”.

Al-Mahdi al-Muntasar, cujo nome remete ao “Imam Oculto”, o 12.º mensageiro de Deus que os xiitas aguardam, é uma mesquita do Hezbollah como tantas outras no sul de Beirute. Mas ela guarda uma peculiaridade. O dinheiro que a ajudou a construir, em 1994, e que a está ajudando a reformar agora, depois de ter sido danificada por fragmentos dos bombardeios israelenses de julho e agosto, vem da comunidade xiita do Brasil e do Paraguai, na Tríplice Fronteira.

Um dos xeques da mesquita, Akram Assaad Barakat, tem um irmão preso desde 2003 no Paraguai, por ter arrecadado e remetido dinheiro para o Hezbollah. Como no Paraguai não havia uma lei antiterrorista na época de sua condenação a cinco anos de prisão, ele foi enquadrado na lei de evasão de divisas e sonegação fiscal – um crime não exatamente incomum no Paraguai; o extraordinário é que seja punido.

Assaad Ahmed Barakat, libanês naturalizado paraguaio, preso em Foz do Iguaçu e extraditado para o Paraguai, nega que tenha ajudado a financiar atividades terroristas. Ele diz que o que fez foi levantar fundos para a mesquita de seu irmão e para instituições de caridade – uma atividade não só aceita como valorizada nas comunidades de imigrantes xiitas ao redor do mundo. 

A partir dos atentados de 11 de setembro de 2001, no entanto, os Estados Unidos incluíram em sua lista negra os orfanatos e outras entidades sociais ligadas a grupos considerados terroristas. Primeiro, porque as contas bancárias e pessoas jurídicas às vezes se confundem. Segundo, porque, na visão do governo americano, essas entidades incentivam o terrorismo, ao oferecer dinheiro mensal, educação e assistência médica aos filhos, viúvas e pais dos “mártires”.

Na quarta-feira, o Departamento do Tesouro americano proibiu a realização de negócios com nove pessoas e duas empresas supostamente vinculadas a Barakat e ao financiamento das atividades do Hezbollah, na Tríplice Fronteira. O Estado marcou dois encontros no decorrer do dia de ontem na mesquita com o xeque Akram, o destinatário do dinheiro arrecadado por seu irmão e outros integrantes da comunidade. O xeque faltou aos dois, alegando imprevistos.

Mas seu colega na mesquita, o xeque Mohamed Khatoun, confirmou que ela foi construída e agora está sendo reformada com ajuda vinda do Brasil. “Isso é normal, sempre recebemos donativos de todos os lugares”, disse o xeque. Khatoun não soube precisar o volume de dinheiro vindo do Brasil. Segundo ele, muitas vezes são doações individuais e pequenas, em valores como US$ 100. O xeque afirmou nunca ter ouvido falar do empresário Muhammad Yusif Abdallah, apontado pelo Departamento do Tesouro americano como um importante líder e principal financiador do Hezbollah na Tríplice Fronteira.

 

O xeque contou que os EUA congelaram as contas de um grande empresário, por ter mandado 1 milhão de liras libanesas – o equivalente a US$ 600. “Estava claro que era uma doação para o orfanato”, disse Khatoun. “Mas os americanos acham que todo dinheiro arrecadado é para comprar armas.”

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