Na fronteira com os EUA, pouco mudou

Maioria dos pedestres e carros atravessa normalmente, e quase ninguém usa máscaras

SAN DIEGO  –O posto de fronteira Tijuana-San Ysidro é o mais movimentado do mundo. Por aqui passam 100 mil pessoas por dia – e, com elas, é provável que o vírus da gripe suína também. Mesmo assim, muito pouca coisa mudou na sua rotina. Apenas se os funcionários da imigração americana detectarem algum sinal de gripe na pessoa é que a separam para uma entrevista.

Foi o que aconteceu, na manhã de segunda-feira, com o pintor Willy Martínez, de 48 anos, cidadão americano nascido em El Salvador. Os funcionários o viram cobrindo a boca para tossir. Martínez explicou que tinha sido assaltado em Tijuana, e os ladrões puxaram um colar do seu pescoço, ferindo sua garganta. Os bandidos tinham levado também os documentos de Martínez, mas os funcionários confirmaram pelo computador que ele era cidadão americano e o deixaram passar.

A grande maioria dos pedestres e carros, no entanto, continua atravessando normalmente, mostrando um documento fornecido pela Imigração ou o passaporte com visto americano. Os carros trazem um aparelho de identificação, reconhecido por um detector do posto de fronteira. Os funcionários averiguam o documento do motorista e o deixam passar. Muitos trabalham em San Diego, nos Estados Unidos, e moram em Tijuana, no México, e vão e vêm diariamente.

“Continua tudo igual”, diz o despachante Cristian Mesa, de 22 anos, que trabalha com legalização de carros importados, e atravessa a fronteira quase todos os dias. “Tinham dito que havia uma epidemia, mas aqui não há nada.” Mesa garante que, apesar de ele morar no México, o epicentro da epidemia, do lado americano, nada mudou. “Não tem feito diferença nenhuma nos Estados Unidos. As pessoas nos tratam igual.”

María Luisa Sayas, de 38 anos, mora há 8 em Chula Vista, San Diego, e atravessa para o lado mexicano de duas a três vezes por semana, para visitar o neto e a nora, que ainda não tem visto para os EUA. “Não mudou nada para mim”, diz María Luisa, casada com um açougueiro mexicano. Ela tem filhos de 21, 18, 4 e 2 anos, e afirma que eles também não têm tido problemas de convívio com os americanos.

De pé no bonde de San Ysidro para San Diego, Carolina López segura seu bebê de sete meses no colo, enquanto ele baba e brinca de lançar a saliva o mais longe possível, vibrando a língua e os lábios. “Vim buscar um remédio para ele, porque está com febre”, explica Carolina, que mora em Tijuana. “Ele nasceu aqui nos Estados Unidos, e tem direito ao remédio grátis.” Ninguém no bonde usa máscara.

“A reação mais espetacular à epidemia foi a do governo mexicano”, diz o sociólogo Jorge Riquelme, diretor do Bay Side Community Center, entidade de assistência a imigrantes em San Diego. “Aqui, uma escola só é fechada, por duas semanas, quando aparece um caso da doença, em geral numa criança mexicana ou que esteve no México.” No México, todas as escolas estão fechadas há duas semanas. No ensino fundamental e médio, as aulas recomeçarão na segunda-feira; nas universidades, amanhã.

Riquelme confirma que os imigrantes mexicanos não se queixam de discriminação relacionada com a epidemia. “Aqui, não vi nenhuma declaração pública de que os mexicanos estão sendo discriminados por causa do vírus”, disse ele. “O que vi foram rumores na imprensa mexicana.”

A secretária de Segurança Pública dos Estados Unidos, Janet Napolitano, descartou a possibilidade de bloquear a entrada dos mexicanos. “O que os cientistas nos têm dito unanimemente é que fechar a fronteira nessas circunstâncias não tem sentido, porque a doença já está disseminada”, disse a secretária, referindo-se aos 226 casos confirmados até segunda-feira nos Estados Unidos, com a morte de uma criança mexicana de 23 meses no Texas.

Do lado mexicano da fronteira, os moradores de Tijuana, maior cidade do Estado da Baixa Califórnia, com 1,4 milhão de habitantes, não levaram a sério os alertas do governo. Ao contrário da Cidade do México, onde os bares e restaurantes serão reabertos hoje, eles não foram fechados, e praticamente ninguém usa máscaras nas ruas. A epidemia foi apelidada de “VIP”, iniciais de “Vírus da Influenza Porcina” (suína).

O Estado registrou apenas 11 dos 727 casos confirmados até segunda-feira no México, e nenhuma morte. Mas o trânsito na fronteira não é apenas local. Calcula-se que 30 mil pessoas cheguem a Tijuana por ano para entrar nos Estados Unidos – legal ou ilegalmente. San Diego tem dez casos confirmados.

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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