Secretário da Fazenda diz ser possível mudar medidas

Alterações ficariam condicionadas desde que algumas condições fossem cumpridas

 

SANTIAGO – A equipe econômica argentina aceitaria efetuar mudanças no pacote anunciado na sexta-feira pelo ministro da Economia, Ricardo López Murphy, se disso dependesse o apoio do ex-ministro Domingo Cavallo — desde que fossem cumpridas três condições: não reduzir salários nem aposentadorias e não aumentar impostos. A afirmação foi feita ontem em Santiago pelo secretário da Fazenda da Argentina, Daniel Artana, que participa da reunião anual do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

Artana, cujo cargo equivale ao de vice-ministro da Economia, ressalvou que, “até agora, ninguém apresentou uma proposta que resulte numa economia de US$ 2 bilhões dos gastos públicos” e contemple essas três condições. O secretário acrescentou que não acredita que haveria “problemas de convivência” entre Cavallo e López Murphy. Mas deu uma resposta incisiva à pergunta sobre se o governo acataria a proposta de Cavallo de substituir a paridade com o dólar por uma cesta de moedas: “A eventual entrada de Cavallo no governo não quer dizer que vá mudar a referência da moeda.”

Artana disse que o objetivo do esforço de corte nos gastos públicos de US$ 2 bilhões, o equivalente a 1% do PIB, é cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal e os compromissos internacionais. Acossado pela imprensa argentina por causa dos efeitos impopulares do corte, Artana desabafou: “Se quisermos recuperar os investimentos na Argentina, temos de aprender a respeitar as leis, os contratos e os compromissos que assumimos.”

Artana previu que a economia argentina voltará a crescer dentro de um ou dois trimestres. Indagado sobre se essa estimativa não era excessivamente otimista, o economista-chefe designado do BID, Guillermo Calvo, também argentino, respondeu que não. “A Argentina está em recessão há três anos e há muitos investimentos que foram postergados”, explicou. “Quando se vai muito mal, é muito fácil recuperar-se.”

Quanto à reação do mercado, que reabre nesta segunda-feira, Calvo disse que todos sabem que o problema é político e vai levar algum tempo para se resolver. Essa é a opinião predominante em Santiago. “Vai haver ainda muitos desdobramentos políticos”, ponderou Paulo Leme, da Goldman Sachs no Brasil.

“O mercado vai estar à espera da solução da equação política”, arrematou Adolfo Sturzenegger, economista do partido Ação pela República, presidido por Cavallo, e cotado para presidir o Banco Central numa eventual ascensão do ex-ministro ao poder.

Cavallo veio no sábado a Santiago, onde participou de um almoço promovido pelo Deutsche Bank e de um jantar do banco de investimentos Bear Sterns. Os dois eventos foram fechados. O ex-ministro, identificado como figura-chave na solução da crise política na Argentina, não falou com a imprensa e voltou ontem cedo a Buenos Aires, para se reunir com o presidente Fernando de la Rúa.

A figura mais próxima de Cavallo que permaneceu em Santiago foi Sturzenegger, que elogiou o pacote de López Murphy. “É absolutamente correto e não havia alternativa”, assegurou. O economista disse ao Estado, no entanto, que tinha uma proposta diferente, com um corte muito mais profundo nos gastos públicos, da ordem de US$ 11 bilhões. Para alcançar esse resultado, o economista da Ação pela República propôs aplicar um redutor de 17% sobre todos os salários e aposentadorias.

Para passar por cima de direitos adquiridos, o economista reconhece que seria necessário um “amplo consenso nacional”, envolvendo até mesmo a Suprema Corte de Justiça. Os argumentos: “Entre 1996 e 2000, o gasto público corrente – deixemos de lado o gasto de capital – aumentou 26%, enquanto o Produto Interno Bruto (PIB) nominal cresceu 5%”, disse Sturzenegger. “O poder aquisitivo do salário na economia informal caiu 15% nos últimos três anos.” Já os funcionários públicos, ao manterem seus empregos, e com eles seus salários nominais, obtiveram incremento no poder aquisitivo, graças à deflação.

“Ou seja, é quase uma questão de justiça, não só de equilíbrio macroeconômico, que o setor público, o único que não se ajustou nominalmente, experimente essa adequação nominal.” Antes da adoção do regime de conversibilidade, argumentou o economista, a moeda se desvalorizava, subiam os preços, os salários continuavam os mesmos e assim se reduzia o poder aquisitivo. Agora, a situação é a inversa.

Sturzenegger garante, também, que a maior parte da redução dos gastos públicos seria compensada com a redução dos impostos, que contribuiria para a retomada do crescimento e para a queda dos preços. “Mas a equipe econômica atual pensou que era mais difícil talvez buscar esse consenso e seguiu o outro caminho, o corte focalizado”, concluiu o economista. 


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