‘Presidente é obrigado a ser prudente na economia’

Para o analista político Carlos Toranzo, Morales poderá buscar poder absoluto, mas eleitores podem contrabalançá-lo, numa Constituinte

 

LA PAZ – Com a legitimidade das urnas e o controle do Parlamento, esse governo tem enormes chances de dar certo. Só terá problemas decorrentes de seus próprios erros. O que não é improvável: o gabinete é formado de “símbolos sociais”, não de técnicos e gerentes. A avaliação é do analista político Carlos Toranzo.

“Vitórias absolutas provocam desejos de um poder ainda mais absoluto, e por isso podem conduzir ao autoritarismo”, adverte Toranzo, pesquisador da Fundação Friedrich Ebert de estudos políticos. Mas a população também pode contrabalançar esse poder, votando na oposição para a Assembléia Constituinte, pondera ele.

Na condução da economia, Toranzo, um dos mais prestigiados analistas bolivianos, acredita que o presidente Evo Morales será prudente, até por falta de opção: “O Estado boliviano é muito débil, precisa do apoio da comunidade internacional.”

O que vai ser desse governo?

É um governo muito forte. Tem muita legitimidade eleitoral, controle quase absoluto do Parlamento. Quer fazer uma Assembléia Constituinte para ter ainda mais poder. Um governo assim tem muitas oportunidades para fazer muitas coisas. Um governo que não seja de esquerda não se pode animar a falar de TLC (Tratado de Livre Comércio bilateral com os Estados Unidos, que Evo Morales encarregou o novo embaixador em Washington de negociar). E esse o faz. Governos de esquerda, ao contrário dos de direita, podem controlar movimentos sociais. Tem uma boa engenharia de conduzir suas relações com as empresas internacionais, com a Petrobrás, com a Repsol… Demonstrou que vai seguir cooperando com elas. As empresas vão passar a ganhar menos, mas vão ficar. Esse governo pode se dar muito bem em termos econômicos. No meio do caminho, tem um problema: administrar o Estado. As legitimidades não resistem à má gestão.

O gabinete é muito despreparado, não?

São símbolos sociais. Até agora, não há sinais de que seus integrantes possam se desempenhar bem na gestão pública. Os únicos problemas são os erros que o próprio governo poderá cometer.

O senhor acha que a Assembléia Constituinte conduzirá a Bolívia no caminho da Venezuela, estabelecendo a reeleição presidencial e reforçando o poder do governo?

Vitórias absolutas provocam desejos de um poder ainda mais absoluto, e por isso podem conduzir ao autoritarismo. Foi o que aconteceu na Venezuela. Essa é uma possibilidade. A outra é que o povo procure contrabalançar esse poder votando na oposição. Foi o que aconteceu nessas eleições (de 18 dezembro) em relação aos governadores. O fato de Evo Morales ter recebido 54% dos votos não significa que toda essa parcela do eleitorado acredite no programa dele. Foi também um voto contra Jorge Quiroga (presidente entre 2001 e 2002 e candidato pelo partido Podemos), contra os partidos tradicionais, contra a velha política e a guerra suja.

Na política econômica, o senhor acha que ele será prudente, como o presidente Lula?

É obrigado a ser prudente, porque o Estado boliviano é muito débil, precisa do apoio da comunidade internacional. O Banco Central é independente, e esperamos que isso não mude.

A reação dos militares contra as nomeações para o comando são isoladas, da parte dos que se sentiram prejudicados, ou há algum ruído na corporação?

 

É difícil saber. É provável que haja ruídos dentro da corporação. Os militares disseram que o presidente violou o Estatuto ao saltar a ordem de promoção da carreira; Morales disse que não. Isso gera incômodo. Mas não é nada que venha a ter conseqüências mais graves.

 

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