Consultor adverte para Gargalos

É com certo ceticismo que o consultor José Carlos Cusnir vê as notícias sobre a nova missão comercial partindo para a China. Cusnir está voltando de um périplo de dez meses pelo mundo, em que tentou, sem sucesso, fechar negócios para uma grande empresa brasileira de informática. O consultor, com 25 anos de experiência internacional em “offshore outsourcing” – a venda de mão-de-obra à distância – tropeçou em todo tipo de dificuldades que deixam o Brasil em desvantagem frente a seus competidores.

“Montei um plano de internacionalização da empresa, mas, ao longo desse processo, concluí que é mais complexo”, diz Cusnir. “Viajar é bacana, mas só dá certo quando se vende. Vender é bacana, mas depois tem que entregar.” Entre as maiores dificuldades apontadas pelo consultor, estão o sistema tributário brasileiro, as leis trabalhistas, a burocracia emperrada e obstáculos de última hora como a greve da Polícia Federal.

Segundo o consultor, faltam ao Brasil acordos para evitar a bitributação com muitos países, a começar pelos Estados Unidos. Por exemplo, se uma empresa brasileira monta um escritório de representação nos EUA, precisa pagar imposto de renda no Brasil quando envia o pagamento dos funcionários americanos, embora lá também eles tenham de recolher seus impostos. É um custo a mais para a empresa, já que os americanos querem receber, do Brasil, o salário líquido, porque terão de pagar impostos lá.

A Colômbia, por exemplo, tem acordo sobre bitributação com os EUA. Assim, empresas brasileiras com filial nos EUA, quando exportam para a Colômbia, faturam a venda nos EUA e não no Brasil, para evitar a mordida do Fisco. Isso sem falar em aumentos de tributos, como o da Cofins no início deste ano, que vitimou o setor de serviços.

Os concorrentes de outros países sabem que a maioria das empresas brasileiras tem pendências na Justiça do Trabalho. Assim, durante processos de concorrência, pedem para serem feitas diligências nas empresas brasileiras, que perdem pontos quando os potenciais clientes descobrem que elas têm problemas na Justiça.

Por isso, na visão de Cusnir, se o Brasil quiser de fato competir no cenário internacional, terá de resolver problemas internos básicos, como seus onerosos e complicados regimes tributário e trabalhista.

O consultor conta que trouxe três executivos japoneses para conhecerem a empresa no Brasil. No desembarque no aeroporto, depararam com uma fila de duas horas e meia, por causa da greve da PF. “Você fica constrangidíssimo”, conta Cusnir. “Gasta com passagens, hotel, restaurantes e já na chegada enfrenta uma situação dessas.”

Cusnir conta também que a empresa saiu à procura de cinco executivos no Brasil que falassem japonês e só encontrou dois. “Não há sequer um programa de intercâmbio com o Japão para treinar executivos.”

No final, diante de todas as dificuldades, a empresa brasileira, que fatura US$ 50 milhões ao ano e emprega 2.300 pessoas, desistiu do projeto de internacionalização, que requereria um investimento de US$ 1 milhão, que lhe pareceu arriscado demais. Cusnir compreendeu a decisão. “O mundo inteiro está galopando, e nós aqui estamos marcando passo”, adverte ele. “Quando decidir que a prioridade é exportar, o governo terá de destravar a economia.”

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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