‘Queremos apenas que as potências bombardeiem os mercenários’

Em entrevista ao ‘Estado’, Khaled al-Sayah, porta-voz do Conselho Militar, diz que rebeldes rejeitam tropas estrangeiras

BENGHAZI – As Forças Armadas rebeldes ainda estão se reorganizando e recuperando seu armamento, depois da “revolução” iniciada no dia 15. Por isso o Exército demorou a reagir na quarta-feira ao avanço das forças leais ao ditador Muamar Kadafi em Brega, 230 km a oeste de Benghazi, a principal cidade controlada pelos rebeldes. Foi o que afirmou ontem Khaled al-Sayah, porta-voz do Conselho Militar, que reúne 15 comandantes das forças rebeldes.

Brega foi retomada por combatentes em sua maioria civis, armados com fuzis Kalashnikov e granadas propelidas por foguetes retiradas da base de Hania, do Exército, em Ajdabiya, 70 km a leste, enquanto as forças leais a Kadafi eram apoiadas por um avião e peças de artilharia.

Em entrevista ao Estado, Al-Sayah, responsável pelo contato entre o Conselho e a Coalizão Revolucionária, liderança civil rebelde, disse que os militares desejam que as potências ocidentais bombardeiem os mercenários que apoiam Kadafi, não as instalações do ditador em Trípoli. Também não querem tropas terrestres estrangeiras.

O advogado, a única face pública do Conselho Militar, cujos membros são mantidos em segredo, afirma que os rebeldes estão em contato com os militares em Trípoli e têm um plano para tomar a capital. Só não sabem quando.

Por que o Exército demorou tanto para enviar armamentos ontem (quarta-feira) para Brega? 

A revolução deixou as Forças Armadas exauridas e desarticuladas. Os revolucionários invadiram os quartéis e tomaram os veículos e armas. Os militares tiveram de reassumir e recuperar o que tinham. Nos últimos dias quisemos nos reorganizar primeiro, antes de entrar em ação, porque não podemos expor as Forças Armadas a uma situação de fragilidade.

Qual o plano do Exército para conter as centenas de mercenários chadianos que, segundo informações da liderança civil rebelde, estão entrando na Líbia?

Nossas linhas de defesa ao redor de Benghazi atingem um raio de 300 km. Ontem recuperamos Brega e avançamos 100 km até depois da região de Al-Gayla (300 km a oeste de Benghazi).

Com tanques e armamento?

Sim. Tudo do que eles precisam, eles têm lá.

Há alguma divisão nas Forças Armadas rebeldes?

De maneira nenhuma. Nunca houve nem há. Todos os membros do Conselho estão em estreita cooperação. Mesmo os civis, incluindo empresas, estão nos apoiando com dinheiro, comida, maquinário. A situação agora é muito estável.

O que os militares esperam dos americanos e das outras potências ocidentais?

Só queremos que eles bombardeiem alvos dos mercenários estrangeiros, porque muitos entraram nos últimos dias, pelo sul da Líbia. Não queremos tropas terrestres. Também não queremos que bombardeiem o Bab al-Azizia (o quartel-general de Kadafi em Trípoli), porque isso transformaria Kadafi em herói.

A linha de divisão dos territórios controlados por vocês e por Kadafi é Ras Lanuf (380 km a oeste de Benghazi)?

No momento, sim.

Estão preparando forças para tomar Trípoli (1.200 km a oeste de Benghazi)?

Sim, num futuro próximo.

Dentro de quanto tempo?

Depende de quanto tempo o Exército precisa se preparar e quantos mercenários vamos enfrentar.

Tem efetivo e armas suficientes para isso?

Temos efetivo. Muitos líbios estão treinando agora nos quartéis. As forças de Kadafi podem ter armamento, mas não a força de vontade que nós temos para derrotar esse regime.

Os militares de Benghazi estão em contato com os de Trípoli?

Há pessoas boas entre os militares em Trípoli que querem se juntar à revolução. A distância é muito grande entre Trípoli e Benghazi e por isso não há uma ação concertada. Temos planos em conjunto com os militares em Trípoli mas ainda não pudemos executá-los. Se Deus quiser executaremos nos próximos dias,

Os civis têm poder sobre os militares?

Temos uma separação entre assuntos militares e civis. Os militares têm sua própria hierarquia. Mas a liderança civil os supervisiona.

Quem é o comandante militar?

Não posso dizer por razões de segurança.

E o sr., não tem medo?

 Não. Kadafi citou meu nome no seu discurso de ontem (quarta-feira). Ele sabe muito bem quem eu sou. Eu não tenho nada a perder. Quem tem é Kadafi.

Publicado no Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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