Das grutas cavadas na rocha partem os Katiushas

‘Sou dono dessa terra, sou filho dessa cidade, e a defendo’, diz combatente do Hezbollah

KABRIKHA, Sul do Líbano – O vilarejo de Kabrikha termina abruptamente numa encosta rochosa, à beira de um vale chamado Wadi Houjer. Na parte de baixo, buracos formam grutas, cobertas por vários metros de rochas. A encosta dá exatamente de frente para o território israelense, cujo ponto mais próximo se situa 10 quilômetros a oeste de Kabrikha.

É dali que os combatentes do Hezbollah lançam os seus foguetes Katiucha, empurrando as bases de lançamento para a boca das grutas, disparando e puxando-as de volta para dentro. No fim da manhã de ontem, sob o ruído contínuo do avião não-tripulado com o qual Israel filma a área, além de um balão de monitoramento e aviões sobrevoando a cidade, um combatente do Hezbollah caminhava de volta para sua casa, sobre a encosta rochosa. Com um irmão e quatro primos morando em Foz do Iguaçu, ele concordou em conceder uma entrevista ao Estado, desde que seu nome e foto não fossem publicados.

“Sou dono dessa terra, sou filho dessa cidade, e a defendo”, começou o combatente, de 45 anos de idade, sentado numa poltrona na sala-de-estar da casa. A seu lado, um filho pré-adolescente e outro de 25 anos, que pousa numa foto, pendurada na parede, ao lado do líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah.

O repórter pergunta se a guerra acabou. “Aqui, sempre tem guerra”, responde ele. “Pára um pouco, mas daqui a pouco começa de novo. É assim desde 1948 (ano da fundação de Israel).” Ele compara: “Se outro país invadir o Brasil e ficar ocupando sua terra, sempre vai ter guerra. Israel ocupa terra libanesa, bombardeia nossas casas. O que podemos fazer? Só a guerra.”

Num canto da sala, está pendurado o retrato de seu irmão, morto em combate com israelenses, em 1990. Num retrato menor, está seu pai, que segundo ele foi preso pelos israelenses em 1993, interrogado e envenenado com uma injeção, vindo morrer aqui, com as mãos e a boca paralisadas. De acordo com o combatente, o pai se recusou a dar informações sobre a resistência em Kabrikha. “Quem vai esquecer isso?”, pergunta ele. “Ninguém esquece o que Israel faz.”

À pergunta sobre se recebe um soldo fixo do Hezbollah, o combatente responde que a organização fornece comida, hospital, escola e tudo mais o que sua família necessite. Seu treinamento foi feito nos campos ao redor, e os combatentes têm fuzis russos AK-47 e americanos M-16. Ele garante que os soldados israelenses são “fracos” na luta: “Nós estamos lutando na nossa terra. Por isso conhecemos o terreno, e lutamos com toda nossa força. Além disso, Deus nos ajuda. Tanto que os aviões destruíram muitas casas, mas poucas pessoas se machucaram.”

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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