Refugiados sírios protestam em campo na Turquia

Acesso aos campos é fechado a jornalistas, mas repórter do ‘Estado’ esteve com dois refugiados

HACIPASA, Turquia – As tensões que vêm se acumulando ao longo de meses nos campos de refugiados sírios no sul da Turquia eclodiram ontem. Moradores do campo de Bohsin, onde vivem 2 mil pessoas, impediram a entrada das duas vans que trazem a comida fornecida por duas empresas e distribuída pelo Crescente Vermelho turco, recusando-se a comer, em protesto contra a qualidade dos alimentos. Eles também se voltaram contra seus líderes, acusados de terem sido cooptados pelas autoridades locais turcas.

O acesso aos campos está fechado aos jornalistas, e os refugiados estão proibidos de sair, mas o repórter do Estado encontrou-se com dois moradores de Bohsin depois do conflito. Mais tarde, eles chegaram a um acordo com as autoridades do governo da província de Hatay, onde se encontram os cinco campos de refugiados, a poucos quilômetros da fronteira com a Síria: receberão alimentos crus e os prepararão eles mesmos dentro do campo, em cozinhas a serem instaladas.

“Se continuarmos a ser tratados assim, queremos ir para outro país”, disseram os dois moradores ao Estado. “Estamos em pior situação do que os que ficaram na Síria.” Eles dizem que a qualidade da comida se deteriorou nos últimos três meses. Com a agravante de que, há dois meses e meio, foram impedidos de sair dos campos e de trabalhar. Com as diárias recebidas pelos bicos que faziam fora dos campos, podiam incrementar sua alimentação. Os refugiados se queixam também de que as crianças, que perfazem um terço da população nos campos, estão recebendo aulas em turco, quando sua língua materna é o árabe.

Eles disseram que falta constantemente eletricidade – a única fonte não só de iluminação, mas de aquecimento, no rigoroso inverno na região, e que há apenas 10 banheiros químicos para as 2 mil pessoas. Há dois meses que Bohsin não recebe novos refugiados. Mas eles contaram que as autoridades sírias abriram as comportas de uma represa no Rio Orontes, que divide os dois países, alagando propositalmente a área, para dificultar a fuga das pessoas. Com isso, 50 tendas submergiram e as famílias tiveram de ser acomodadas em outras barracas, já superlotadas.

Nos cinco campos, vivem no total 11 mil sírios, todos em tendas de lona do Crescente Vermelho turco. Os sírios reclamam status de refugiados para poderem receber assistência das agências da ONU e serem transferidos para outros países. “Já estamos nessa situação há nove meses, e não sabemos quando isso vai acabar. Não tem sentido nos negar o status de refugiados”, disseram os dois entrevistados pelo Estado. Por orientação das autoridades turcas, os moradores do campo de Bohsin elegeram oito representantes perante o governo de Hatay. Mas os entrevistados – entre eles o irmão de um desses representantes – disseram que eles recebem refeições fora do campo, e que passaram para o lado das autoridades turcas.

Eles afirmam que a situação nos outros campos é ainda pior do que em Bohsin. Diariamente, em torno de 100 novos refugiados sírios entram na Turquia, fugindo dos combates, apesar do cerco imposto pelo Exército sírio.

Publicado em O Estadão. Copyright: Grupo Estado. Todos os direitos reservados.

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